Translate (tradução)

quinta-feira, maio 01, 2025

ANTIGAMENTE: NANYI WANGIBONGELA KAMBONGA KA DYALA?

[Quem terá encontrado uma criança de sexo masculino?]

O tambor, uma lata de leite em pó de qualquer marca, agredido por um ferro, um pedaço de madeira ou uma pedra, gritava ao máximo de sua força e potência sonora. Pá-pá-pá-pá.

Atrás do som, uma, duas ou três senhoras, lábios secos e pés empoeirados de tanto gritar e caminhar, soltavam um coro, alegre para a nossa inocência de kandenges e preocupante para as mamães que podiam estar naquela situação um dia, a contar com as nossas travessuras e o seguidismo ao Mam-Brás, ao cavalo-tica-tica, e, sobretudo no tempo de Carnaval [que ainda era da vitória]. Essas, as mamães, confirmavam antes a presença dos seus tumbonga e prestavam-se em passar informação e pedir detalhes sobre o garoto ou garota desaparecida.

- Pá-pá-pá... O gritar intrépido da lata já ampliado ia deixando rasto na rua varrida, manhã cedo, pelas mamães que não permitiam o convívio com a imundície com que nos confrontamos hoje. Nisso de limpeza das ruas, cada mamã ou sua filha, adulta ou adolescente, atacava o seu lado. O lixo tinha lugar, o balde, no quintal, e depois o depósito com ou sem contentor.

Atrás do barulho da lata, ou quase em simultâneo, a manhã aflita e suas companheiras gritavam, quase já sem forças. Animava as apenas a esperança em reencontrar o filho amado.

_Nanyi wangibongela kambonga Ka dyaléééé? E a lata tambor continuava batucando.

É esse o Rangel do meu tempo, século passado, quarenta e cinco anos já.

E o som, as trambiquices, as magoelas na carroça do carro do vizinho ou dum visitante qualquer, as pescarias de "bagudas" na vala Senado da Câmara, junto ao Catetão, as cercanias da DTA para apanhar loiça descartável já descartada, os pinos na Chicala e ou na Praia do Mbungu, as castanhas de caju que só o comboio permitia chegar ao quilómetro trinta de Viana, tudo isso ainda no ouvido e na memória.

- Vocês, estão a ouvir né? É melhor tomarem cuidado. Se calhar quem se perdeu é vosso amigo da bola ou de brincadeiras. Quando a mamã fala não sai é mesmo para não sair.

Qualquer vizinha era tia. Era mamã no aconselhar, no repreender, se necessário, e acarinhar quando injuriado. 

_ Filho 'lheio tem 'mbora razão dele. P'ra quê só fazer no filho da outra quando você também tem kambonga? - Acudiam, quando nos visse injustiçados.

Hoje, com escolas do povo, colégios privados, ATL e creches para todos os bolsos, media e redes sociais para todos, nem o pregão que procura o filho desaparecido, nem as brincadeiras são as mesmas. Tudo mudou. Até às razões das desapropriações dos meninos. Hoje a atenção redobrada é com raptores de menores. Porque a TV os jogos, as escolas e os quintais murados feitos prisões já não as leva tanto a caçar gafas, apanhar peixinhos para guardar em aquário de garrafão cortado, nadar inocentes no perigo da Chicala e Mbungu ou pendurar-se ao comboio para chegar à fonte de castanhas de caju. São outros os males e os remédios também.

=

Publicado pelo Jornal de Angola, a 30 de março de 2025.

Sem comentários: