Se tivesse de viajar num azul-e-branco teria de gastar, ao fim do percurso que separa o Aeroporto 4 de Fevereiro ao Bairro Vila Nova, Akz. 400,00 divididos em 4 trechos de igual valor. Foi a pobreza momentânea que o forçou, naquele dia último da tolerância, a optar pelo transporte colectivo urbano.
Há muito não fazia tais enfrentamentos. Contava o seu calendário dois anos e meio desde que propositadamente fez o percurso Rangel/Viana para registar os cânticos anónimos. Mas de lá para cá muita coisa mudou. Pelo menos, dizia-se nos jornais,Rádio e Tv que muita coisa havia evoluído. Apregoaram-se autocarros limpos, equipados com AC, cômodos e silenciosos, com mais jornais em leitura do que falas soltas.
O primeiro machimbombo que por ele passou tinha as iniciais Segura a Gola d’Outro e estava apinhado de gente. Tudo quanto ouvira levaram-no e pensar que se tratasse de um funeral e não desistiu da espera. O segundo, da companhia Tira o Colete e Ultima a Luta, também rebentava pelas chaparias.Desesperado tentou enfiar-se por um espaço que restava entre pernas mal colocadas na pequena escadaria do pesasdo, mas sem sucesso. Desistiu.
Pagou os primeio Akz.100,00 para um percurso aproximado de 2km. Encontrou uma agência bancária com multi-caixa e tentou a longa fila. Os Kuanzas acabaram e a reposição tardava com a mesma persistência com que o sol atingia o epicentro.
À saida da agência, colocou a mala sobre o lancil, à sobra duma velha acácia húmida de mijo. Riu de forma aberta, espantou os nervos e caminhou mais um trecho. Agora sem dinheiro e sem força nas pernas, Kambuta limpa a mala, esconde os óculos que o identificam com facilidade e mistura-se num aglomerado que aguarda pelos autocarros. Estava perante o último recurso.
_ Nao há escolha! introspectou.
Ao primeiro, da companhia Tira a Ultima Risada e Anda, atrasou-se e faltou-lhe fprça [para a peleja da entrada, mas ao segundo machimbombo, da Nossopaistral, não titubeou e nem mesmo os passageiros à boca da porta o fizeram desistir. Estava já há duas horas na capital, tempo superior ao da viagem aérea em que transpôs mil kilómetros.
_ Tomara que seja mesmo climatizado, falou aos botões.
Já dentro, os empurrões e os cheiros desencontrados davam-lhe as boas vindas. Gelados de múcua, kikuanga, makayabo, kapuka madrugador, vômitos mal lavados e outras náuseas imundas fazia o coktail fedorento.
-Moço, mi disculpa paizinho! toca à frente! ordenou a cobradora.
Num lugar não distante da porta frontal, que servia de entrada, uma jovem nos seus virginais 15 aninhos reclamava:
_Possas! até cheiro de liamba? Para quê que não vão mbora à pé? Alguém tem de ver isso, disse desesperada.
Entre reencontros provocados pelas travagens repentinas e contorsões da viatura que soluçava ao encontro dos enormes buracos deixados pela chuva abrilena na estrada repavimentada, os passageiros iam tomando contactos mais íntimos. Corpo a corpo e suor no suor, qual molhados de fogo da paixão.
Não longe da porta de saída, uma velha, nos seus mabelas azuis, gritava apavorada: Mano, me meteram kibiona! É bandido. Motorista vai na polícia.
Aflito, o infractor tenta escapar pela janela gradeada do machimbombo, mas é agarrado pelas pernas e castigado conforme a lei mosaica e jogado ao longo da avenida Cristina Rodrigues.
Mais se parava, mais se falava e mais se ia trocando salivas das falas dispersas, deixando fervilhar no ar um perfume de aromas desconhecidos. E tudo mudava.
Os penteados desfeitos pareciam noites intermináveis de amor da puberdade, ao passo que outros cabelos, industriais ou herdados de indianas, jazziam também sapato abaixo, naquele chão, evocando aos fios o sofrimento que é uma viagem nos machimbombos de Luanda.
Foi nesse clima que Kambuta reencontrou a capital, a horas da declaração da Tolerância Zero aos desmandos dos automobilistas. Os cintos de segurança, os porta-bebés, os macacos, os colectes reflectores, as chaves de rodas e outros apetrechos passam a ser obrigagórios e as penalizações vão até ao tecto de 2 anos de salário mínimo.
Na ruas as más línguas apregoam para o Primeiro de Maio um parlatório candongueiro no largo que acolheu a missa campal de Bento XVI na sua peregrinação por Luanda, à Cimangola, para reclamar das vindouras multas policiais.
As boas línguas, porém, reforçam na media que ninguém mais abortará a aplicação da Mudança. Apregoa-se também, nos altifalentes públicos e privados de vocação pública, a inundação da cidade de novos autocarros. Políticos, empresários e pseudo-empresários revezam-se nas promessas e a “Revolução Viária” se torna palavra de ordem. A mesma ordem que ainda se confunde com a “gasosa” das multas adiadas em conversas de cavalheiros.
Já em casa, Kambuta, maltratado pela viagem, é recebido apenas por uma das filhas que o reconhece pelas rugas no rosto.
_ Como foi a viagem papá?
_ Terrível filha, terrivel! Os autocarros são baratos mas bastante infernais, respondeu aborrecido.
O primeiro machimbombo que por ele passou tinha as iniciais Segura a Gola d’Outro e estava apinhado de gente. Tudo quanto ouvira levaram-no e pensar que se tratasse de um funeral e não desistiu da espera. O segundo, da companhia Tira o Colete e Ultima a Luta, também rebentava pelas chaparias.Desesperado tentou enfiar-se por um espaço que restava entre pernas mal colocadas na pequena escadaria do pesasdo, mas sem sucesso. Desistiu.
Pagou os primeio Akz.100,00 para um percurso aproximado de 2km. Encontrou uma agência bancária com multi-caixa e tentou a longa fila. Os Kuanzas acabaram e a reposição tardava com a mesma persistência com que o sol atingia o epicentro.
À saida da agência, colocou a mala sobre o lancil, à sobra duma velha acácia húmida de mijo. Riu de forma aberta, espantou os nervos e caminhou mais um trecho. Agora sem dinheiro e sem força nas pernas, Kambuta limpa a mala, esconde os óculos que o identificam com facilidade e mistura-se num aglomerado que aguarda pelos autocarros. Estava perante o último recurso.
_ Nao há escolha! introspectou.
Ao primeiro, da companhia Tira a Ultima Risada e Anda, atrasou-se e faltou-lhe fprça [para a peleja da entrada, mas ao segundo machimbombo, da Nossopaistral, não titubeou e nem mesmo os passageiros à boca da porta o fizeram desistir. Estava já há duas horas na capital, tempo superior ao da viagem aérea em que transpôs mil kilómetros.
_ Tomara que seja mesmo climatizado, falou aos botões.
Já dentro, os empurrões e os cheiros desencontrados davam-lhe as boas vindas. Gelados de múcua, kikuanga, makayabo, kapuka madrugador, vômitos mal lavados e outras náuseas imundas fazia o coktail fedorento.
-Moço, mi disculpa paizinho! toca à frente! ordenou a cobradora.
Num lugar não distante da porta frontal, que servia de entrada, uma jovem nos seus virginais 15 aninhos reclamava:
_Possas! até cheiro de liamba? Para quê que não vão mbora à pé? Alguém tem de ver isso, disse desesperada.
Entre reencontros provocados pelas travagens repentinas e contorsões da viatura que soluçava ao encontro dos enormes buracos deixados pela chuva abrilena na estrada repavimentada, os passageiros iam tomando contactos mais íntimos. Corpo a corpo e suor no suor, qual molhados de fogo da paixão.
Não longe da porta de saída, uma velha, nos seus mabelas azuis, gritava apavorada: Mano, me meteram kibiona! É bandido. Motorista vai na polícia.
Aflito, o infractor tenta escapar pela janela gradeada do machimbombo, mas é agarrado pelas pernas e castigado conforme a lei mosaica e jogado ao longo da avenida Cristina Rodrigues.
Mais se parava, mais se falava e mais se ia trocando salivas das falas dispersas, deixando fervilhar no ar um perfume de aromas desconhecidos. E tudo mudava.
Os penteados desfeitos pareciam noites intermináveis de amor da puberdade, ao passo que outros cabelos, industriais ou herdados de indianas, jazziam também sapato abaixo, naquele chão, evocando aos fios o sofrimento que é uma viagem nos machimbombos de Luanda.
Foi nesse clima que Kambuta reencontrou a capital, a horas da declaração da Tolerância Zero aos desmandos dos automobilistas. Os cintos de segurança, os porta-bebés, os macacos, os colectes reflectores, as chaves de rodas e outros apetrechos passam a ser obrigagórios e as penalizações vão até ao tecto de 2 anos de salário mínimo.
Na ruas as más línguas apregoam para o Primeiro de Maio um parlatório candongueiro no largo que acolheu a missa campal de Bento XVI na sua peregrinação por Luanda, à Cimangola, para reclamar das vindouras multas policiais.
As boas línguas, porém, reforçam na media que ninguém mais abortará a aplicação da Mudança. Apregoa-se também, nos altifalentes públicos e privados de vocação pública, a inundação da cidade de novos autocarros. Políticos, empresários e pseudo-empresários revezam-se nas promessas e a “Revolução Viária” se torna palavra de ordem. A mesma ordem que ainda se confunde com a “gasosa” das multas adiadas em conversas de cavalheiros.
Já em casa, Kambuta, maltratado pela viagem, é recebido apenas por uma das filhas que o reconhece pelas rugas no rosto.
_ Como foi a viagem papá?
_ Terrível filha, terrivel! Os autocarros são baratos mas bastante infernais, respondeu aborrecido.
Luciano Canhanga
1 comentário:
Conheço esse mwadié da foto do autocarro. (brincadeira...) Foi agradavel surpresa. Abraços
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