Por: Luciano Canhanga*
Em Luanda, capital da República de Angola, as zungueiras — termo da língua ambundu que designa vendedeiras ambulantes — têm revelado engenho e capacidade de adaptação ao mercado, mesmo sem formação académica especializada.
Tradicionalmente, estas senhoras percorriam as ruas em grupo, em silêncio ou com pregões ocasionais, repartindo os clientes em vez de os disputar com arte e astúcia. Tal prática, embora solidária, mostrava-se pouco eficaz em termos de venda.
Reconhecendo a necessidade de mudança, algumas zungueiras decidiram gravar mensagens promocionais que são difundidas por meio de megafones. Esta solução evita o cansaço da voz e permite maior alcance auditivo. Em acto contínuo, passaram a caminhar sozinhas ou acompanhadas de colegas que vendem produtos distintos, evitando concorrência directa e promovendo complementaridade comercial.
Trata-se de uma verdadeira inovação marketista fora dos muros da academia, nascida da observação empírica e da inteligência prática. O fenómeno pode ser compreendido à luz do pensamento de Philip Kotler, que defende que o marketing não se limita à publicidade, mas envolve a criação de valor e adaptação ao consumidor. Também Seth Godin, ao abordar o marketing de permissão e a autenticidade, valoriza práticas que emergem da realidade concreta e da escuta activa do público.
Eis o pregão da mamã zungueira que vende gelado, refrescando os petizes em dias solarengos de Luanda, enquanto percorre as ruas, de aduela em aduela e de esquina em esquina:
_ O gelado kuya;
De laranja kuya:
De banana kuya;
De morango kuya.
Papá me mima só, gelado está a passar;
Mamã me mima só, gelado está a passar; Avó me mima só, gelado está a passar!
Este exemplo revela que a ausência de escolaridade formal não equivale à ausência de inteligência ou de capacidade inventiva. As zungueiras, com criatividade e sentido prático, reinventam o comércio popular urbano e contribuem para a economia local com soluções originais e eficazes.
Autores como Guy Kawasaki, ao falar sobre o espírito empreendedor, e Alvin Toffler, que em A Terceira Onda valoriza o saber prático como motor de transformação social, ajudam a compreender que a inovação não é monopólio das instituições formais. Também Carolina Schmitt Nunes e Gertrudes Dandolini, ao estudarem práticas de marketing em contextos não convencionais, reforçam a legitimidade destas estratégias emergentes.
As zungueiras de Luanda, com megafone em punho e criatividade em marcha, são exemplo vivo de como o pensamento estratégico pode florescer nas margens da academia, com impacto directo na vida urbana e no consumo quotidiano.
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*Graduado em Comunicação Social e MSc em Ciências Empresariais

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