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quinta-feira, junho 26, 2025

ISRAEL vs EUA: QUEM MANDA EM QUEM?


Historicamente, os EUA têm sido o principal financiador militar e diplomático de Israel, fornecendo bilhões de dólares em ajuda anual (em grande parte militar) e defendendo Israel em fóruns internacionais como o Conselho de Segurança da ONU.

Muitos governos israelitas seguem uma linha que não contradiz frontalmente os interesses estratégicos americanos, especialmente no que diz respeito ao combate a adversários comuns como o Irão.
Na prática política, o lobby pró-Israel nos EUA (especialmente o AIPAC – American Israel Public Affairs Committee) é poderoso, influente tanto em ambos os partidos (Democratas e Republicanos) como nas decisões do Congresso e da Casa Branca.
Muitos analistas dizem que os EUA muitas vezes ajustam as suas políticas no Médio Oriente para se alinharem com os interesses israelitas, mesmo que isso aumente tensões com outros países árabes ou com o Irão.
Governos israelitas, como o de Benjamin Netanyahu, demonstraram agir com bastante autonomia e até desafiar presidentes americanos (como Obama), com relativo sucesso.
Quem manda em quem, então?
Em vez de uma relação de mando vertical, o que existe é uma simbiose estratégica com desequilíbrios:
Israel depende dos EUA para sobrevivência militar e diplomática.
Os EUA dependem de Israel como parceiro estratégico no Médio Oriente, como "ponte militar e tecnológica" e como peça-chave no xadrez contra o Irão.
Todavia, em alguns momentos, o lobby israelita consegue exercer mais pressão sobre a política externa americana do que qualquer outro grupo estrangeiro — e isso dá a impressão, não infundada, de que Israel consegue influenciar os EUA mais do que o contrário em certos temas-chave (como ataques ao Irão, ocupação de territórios palestinianos, expansão de colonatos, etc.).

Conclusão:
Não é que um "mande" no outro de forma absoluta, mas a influência israelita nos EUA é muito mais forte do que a de qualquer outro país aliado. O resultado é uma relação em que os EUA continuam dominantes globalmente, mas Israel exerce influência desproporcional dentro da política interna e externa americana — especialmente quando se trata de segurança, Irão e questões palestinianas.
A bibliografia demonstra claramente que:
O lobby israelita está profundamente enraizado nas estruturas políticas americanas (legislativo, executivo, eleitoral).
A influência exerce-se em momentos cruciais — desde ajuda de segurança até decisões sobre Irão — muitas vezes moldando a agenda independente da execução formal dos EUA.
Embora os EUA mantenham a autoridade global, a capacidade de pressão do lobby israelita faz com que Israel actue de forma desproporcional no seio da política externa americana — reforçando a ideia de que, em várias ocasiões, Israel “manda” nos EUA.

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Bibliografia para compreender o acima escrito
1. John Mearsheimer & Stephen Walt – The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy (2007).
Na obra rgumenta-se que o lobby pró-Israel é uma “coligação solta” que orienta fortemente a política externa americana em direcção a Israel, muitas vezes em prejuízo dos interesses nacionais dos EUA.
2. Paul Findley – They Dare to Speak Out (1985)
Escrita por um ex–congressista dos EUA, documenta como o lobby influenciou decisivamente eleições e vectou políticos considerados críticos a Israel.
3. Grant F. Smith – Foreign Agents: AIPAC From the 1963 Fulbright Hearings to the 2005 Espionage Scandal.
O livro reúne documentos e testemunhos que mostram AIPAC como um agente não-oficial do governo israelita — e seu impacto nos EUA.
4. Yosua Saut Marulitua Gultom & Hafidz Zaula Miftah – “The Role of the Jewish Lobby Toward US Foreign Policy Making on the 2023 Israel-Palestine War (Case of AIPAC)” (2024).
É um estudo académico que confirma a influência profunda de AIPAC nas políticas americanas recentes, via apoio directo a campanhas e presença em altos escalões.
5. Rizki Maulana Firdaus – “The strategy and effectiveness of The American Israel Public Affairs Committee in lobbying The United States Congress” (2023).
A pesquisa qualitativa documenta a influência de AIPAC no Congresso, nomeadamente ao sustentar o envio anual de cerca de US$ 3,8 mil milhões em auxílio militar a Israel.

domingo, junho 22, 2025

NECESSÁRIAS OU ULTRAPASSADAS PELO TEMPO?

Quem circula(r) por estradas angolanas encontra(rá) muitos escombros destas antigas casas que foram de reconhecida serventia às equipas de manutenção das estradas nacionais.

Distanciavam-se em intervalos aproximados de 50 quilómetros, que se encurtavam em função das condições geológicas do terreno e necessidades de manutenção da rodovia. O tempo, o descaso e alguma pilhagem cuidaram da sua destruição.

A Casa do Cantoneiro era uma estrutura utilizada para alojar trabalhadores responsáveis pela manutenção das estradas, conhecidos como cantoneiros. 

Em Angola, as casas dos cantoneiros serviam como pontos de apoio para os cantoneiros, que realizavam reparos, limpeza e conservação das vias públicas, garantindo a segurança e trafegabilidade das estradas.

Essas casas geralmente pertenciam a instituições ligadas à administração rodoviária, como os antigos serviços de obras públicas ou departamentos de infraestrutura viária. 

Em muitos países, a função dos cantoneiros foi absorvida por empresas privadas ou modernizada com novas tecnologias.

Um exemplo de país que ainda mantém o conceito de cantoneiros é Portugal, onde algumas regiões preservam a tradição dos cantoneiros para a manutenção de estradas secundárias e rurais. 

Em certos casos, as antigas casas do cantoneiro foram restauradas e reaproveitadas para outros fins, como turismo rural ou centros comunitários.

Em Angola, as casas dos cantoneiros eram pertença da JAEA (Junta Autónoma de Estradas de Angola) e, nos anos do meu despertar (início da década de 80 do século XX), eram usadas pelo pessoal afecto ao MCH (Ministério da Construção e Habitação).

A intensificação da guerra, o descaso e pilhagens, nalguns casos, levou à destruição total das casas dos cantoneiros que conheço.

Você que leu o texto e/ou conhece algumas, o que acha?

_ São para reabilitar ou para deixar como estão?

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Foto editada: DR

quarta-feira, junho 18, 2025

A PRIMEIRA VÍTIMA DA GUERRA

"Os bandoleiros a mando do imperialismo atacaram uma aldeia inocente, tendo sido energicamente rechaçados pelas nossas gloriosas forças armadas. Na sua retirada, assassinaram cinco mulheres e nove crenças, roubando 15 cabeças de gado bovino".

Faixa de Gaza

Textos escritos ou oralizados como este (acima) eram comuns no tempo da guerra civil angolana e o discurso mecanizava-se de cabeça a cabeça, de adultos para crianças que o carrega(v)am para toda a vida ou até quando descobrirem a diferença entre propaganda e jornalismo, duas ferramentas de comunicação.

Fiquei ontem a "discutir" com o Copilot, uma ferramenta de IA desenvolvida pela Microsoft, uma empresa americana.

A causa foi o facto de esta ferramenta me ter apresentado como vítimas israelitas (apenas) mulheres e crianças, assim como na Ucrânia também só se fala de mulheres e crianças como vítimas.

Quando perguntei se os mísseis e drones iranianos só escolhiam mulheres e seus filhos menores, a aplicação não respondeu. Fiquei a resmungar, o que levou a mulher a dar-me como enlouquecido.

_ Como te prestas a discutir com uma aplicação digital? _ Questionou.

Hoje, depois de mais uma pesquisa a várias fontes sobre as causas históricas, as acções e a escalada iniciada a 13 de Julho, perguntei ao meu "ajudador" se os media têm sido equidistantes. Veja a resposta (as partes entre parêntesis são meus acréscimos).

_ A equidistância dos media é um tema delicado. Em geral, os veículos ocidentais tendem a enfatizar o direito à autodefesa de Israel e a ameaça representada pelo programa nuclear iraniano (assim como restringir as vítimas a mulheres e crianças); as fontes iranianas e aliadas destacam as vítimas civis, a soberania nacional e denunciam o que chamam de “agressão sionista”;  as agências internacionais como Reuters, BBC ou Al Jazeera tentam manter um tom mais neutro, embora estas sejam frequentemente acusadas de parcialidade — dependendo de quem lê (quem escreve e quem comenta). Ou seja, a percepção que os media nos dão é moldada por filtros culturais, políticos e editoriais. A realidade no terreno é sempre mais complexa do que qualquer manchete.

"Nunca se mente tanto como em véspera de eleições, durante a guerra e depois de uma caçada" (Otto Von Bismark). É verdade! "A verdade é a primeira vítima em uma guerra".


domingo, junho 15, 2025

O KOKOTO[1] QUE DIZIMOU PIOLHO


Um conterrâneo da Kibala, recuando no tempo, narrou episódios da nossa infância que é transversal a uma geografia que envolve os municípios à volta do Libolo e Kibala e num tempo que, se calhar, morre em 2000, podendo prolongar-se em algumas aldeias recônditas. É o nosso feudalismo que pouco há de escrito, dada a fraca imersão na nossa etno-sociologia e etnografia.

Quando nos debruçamos a estudar a história clássica e medieval de Roma e Grécia, recaímos, invariavelmente, em episódios angolanos do Séc. XX, em nossas aldeias interiores.

É exemplo a mãe que "cata" piolhos ao filho, aproveitando adormecê-lo, podendo usar duas fórmulas: cantando e catando.

Vivi esse tempo. Algumas mães, no escuro da noite, sem saber se o achado por seus dedos entre o cabelo alto e sujo é ser vivo ou grão de areia, levavam-no ao dente e largavam depois, um rio de saliva.

Vivi ainda o tempo da bitacaia[2], pulga de javali ou porco doméstico que adentrava os terminais de nossos dedos e calcanhares. A comichão, lenta e incómoda, resultava em dor da ferida escancarada, depois de extraído o animal hóspede oportunista com a ponta de um alfinete ou de um pau aguçado.

Mas o meu conterrâneo contou mais e recordou-me o seguinte:

Noite sem luar na Kibala ou outra aldeia do circuito ambundu kwanza-sulino. Nas terras mais a sul e ou norte o cenário também pode ser idêntico.

O archote é lamparina na cozinha escura. A kizaca, peixe de água doce ou carne de caça ferve na panela de barro. Há fumo largado pela lenha que reclamam por mais dias de seca ao sol. Mas quando a lenha seca rareia em tempo de chuva é a semi-seca que se leva à fogueira. No escuro e fumegante da cozinha a mãe pede:

_ Mwiha mwombya (alumia para a panela)!

Na atrapalhação, o rapaz tanto alumia como deixa cair na panela a ponta do archote ardido, já em forma de cinza.

_ Nzayá, matubá, matondoá![3] -Dispara a mãe impaciente, complementando a emenda com um valente "coco" que mata uma dúzia de piolhos e lêndeas na cabeça do infante.

_  Kwolule (não grita). _ Adverte a mãe, prevenindo para que não se acabem, de uma só vez, os piolhos todos na cabeça com outros kokoritos.

Terminada a confeção do "kondutu"[4], é a vez da panela do funji/pirão. O cuidado é redobrado. Em fuba branca, a cinza preta do archote é vinho tinto em toalha imaculada.

_ Mwiha kyambote. _Volta a advertir a progenitora.

E o infante, com um grito adiado ou reprimido da primeira pancada, lágrimas do fumo nos olhos, comichão na cabeça dos piolhos famintos de sangue, acende, de novo, o archote que aproxima delicadamente à panela de barro para a qual o fogo chia.

_ Mwiha!

_ Ñyi mwiha, a mama!

_ Mwiha kyambote

Depois o repasto: as meninas na cozinha ou fora dela, no terreiro da casa, com a mãe, quando há luar. Os homens na sala ou no njangu. Rapazes juntos.

O rapaz quando não vai à escola da vida, o njangu, volta a reclamar o carinho materno, "lambicando" como cão que se deita sobre a cinza quente da fogueira recente. Dobra-se à frente da mãe que "jijina"[5] lêndeas, piolhos ou grãos de areia escondidos no cabelo a reclamar por uma tesoura.

Contando anedotas, ou canções do seu tempo de menina, a mulher afugenta os males e a infra vida que a pobreza impõe, adormecendo o infante para uma nova aurora e lavoura.

Tal como a geração do último quartel do Séc. XX, as nossas crianças continuarão a ler a história clássica e o feudalismo greco-romano. Quanto às nossas vivências, que são recentes, restarão poucas crónicas!

[1] Golpe na cabeça com o punho cerrado.

[2]  Insecto díptero da família dos tungídeos.

[3] Despautério.

[4] Acompanhante.

[5] Acaricia. Faz cafuné.

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Publicado pelo Jornal de Angola a 13 de Abril de 2025.

sexta-feira, junho 13, 2025

ISRAEL BÍBLICO E O ESTADO DE ISRAEL MODERNO

(Fé, história e geopolítica)

A distinção entre Israel bíblico e o Estado moderno de Israel é fundamental para compreender as complexas relações entre religião, identidade e política no Oriente Médio. Israel bíblico refere-se a um povo e a um território descrito nas Escrituras hebraicas, cuja origem remonta aos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó, e que se consolidou como reino unificado sob Saul, Davi e Salomão por volta do século X a.C. Após a divisão do reino e sucessivas invasões, o povo judeu foi disperso em diásporas, mantendo, contudo, uma identidade religiosa e cultural centrada na Torá e na esperança messiânica.

Já o Estado de Israel foi fundado em 14 de maio de 1948, como resultado do movimento sionista, que buscava estabelecer um lar nacional judeu na Palestina histórica. Essa fundação foi impulsionada por fatores como o antissemitismo europeu, o Holocausto e o apoio político de potências como o Reino Unido e os Estados Unidos. A criação do Estado gerou conflitos com a população árabe-palestina local e com países vizinhos, inaugurando uma série de guerras e tensões que perduram até hoje.

No campo religioso, o judaísmo e o cristianismo compartilham raízes comuns, mas divergem em pontos centrais. Ambos são monoteístas e reverenciam o Antigo Testamento (ou Tanakh, no judaísmo), mas o cristianismo acrescenta o Novo Testamento, centrado na figura de Jesus Cristo, considerado o Messias e Filho de Deus. Para os judeus, Jesus não é o Messias prometido, e a espera por esse redentor ainda permanece. Essa diferença teológica é o principal divisor entre as duas tradições.

Os livros sagrados refletem essa cisão: o judaísmo baseia-se na Torá (os cinco primeiros livros de Moisés), nos Profetas e nos Escritos — conjunto conhecido como Tanakh — enquanto o cristianismo adota a Bíblia, composta pelo Antigo e pelo Novo Testamento. A Bíblia cristã reorganiza e interpreta os textos hebraicos à luz da vida e ensinamentos de Jesus.

Quanto aos profetas, Moisés é a figura máxima do judaísmo, considerado o legislador e mediador da aliança com Deus. No cristianismo, Jesus é o profeta supremo, mas também o Messias e Salvador. Ambos reconhecem profetas como Isaías, Jeremias e Elias, que são figuras comuns às duas tradições, embora interpretadas de formas distintas.

As convergências entre judaísmo e cristianismo incluem a crença em um Deus único, a valorização da ética, da justiça e da oração, além da origem comum no Oriente Médio. As divergências, por sua vez, envolvem a cristologia, a doutrina da Trindade, os sacramentos e a escatologia. O cristianismo se expandiu como religião universalista, enquanto o judaísmo manteve-se como uma fé étnico-religiosa.

O Estado de Israel, desde sua fundação, tem recebido apoio político, militar e científico de diversas nações, especialmente dos Estados Unidos, que se tornaram seu principal aliado estratégico durante a Guerra Fria. A aliança inclui cooperação em defesa, tecnologia, inteligência e diplomacia. Israel também desenvolveu uma indústria militar e científica robusta, com destaque para a cibersegurança, a agricultura de precisão e a medicina. A fundação do Estado foi aprovada pela ONU em 1947, com a proposta de partilha da Palestina em dois Estados — um judeu e um árabe —, mas a rejeição árabe à partilha levou à guerra de independência de 1948.

A doutrina do Estado de Israel é moldada por uma combinação de princípios democráticos, identidade judaica e segurança nacional. Embora se defina como um Estado judeu e democrático, essa dualidade gera tensões internas, especialmente em relação aos direitos da minoria árabe-palestina e à ocupação dos territórios palestinos. O sionismo, em suas diversas vertentes, continua a influenciar a política israelense, ora como nacionalismo secular, ora como messianismo religioso.

Assim, a compreensão das diferenças entre o Israel bíblico e o moderno, entre judaísmo e cristianismo, e entre fé e política, revela não apenas as raízes de conflitos contemporâneos, mas também os desafios de coexistência e diálogo entre tradições que compartilham uma origem comum, mas trilharam caminhos distintos.

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Coligido por Soberano Kanyanga (com suporte do Copilot)

domingo, junho 08, 2025

CRIANDO SOBRE A CRISE

Conversavam sobre o futuro da gestão dos seus lares, agora que a economia do país enfrenta dificuldades. Zara e Kuka são comadres e colegas de trabalho.

_ Kuka,sabes quais são os princípios que uma boa administradora de casa precisa ter para cuidar bem das finanças pessoais e educar os de casa? _Questionou Zara que frequentara um curso de economia doméstica.

_ Não, colega Zara. Podes explicar-me? 

Kuka estava expectante, ante as conversas que ouvira durante o percurso de casa ao local de prestação de serviços.

_ Olha bem! _ Começou Zara. _ Mapear os alvos, as metas e a missão é de extrema importância. A isso se junta a visão que aponta o que queremos ser ou fazer e a disciplina que nos permite estarmos focados naquilo que idealizámos. É preciso também coragem e generosidade. _ Explicou à amiga que seguia com atenção.

Zara, percebi algumas coisas, mas, que tal se me deres mesmo uma lição. Sei que és mais ou menos entendida nessas coisas de economia doméstica. – Solicitou Kuka.

_ Planeamento é projectar, tencionar ou elaborar um o plano. Por exemplo, queres diminuir as compras porque a receita ou o que recebes no fim do mês baixou ou o valor nominal se mantém, mas o poder de compra baixou. Nesse caso, tens de fazer um projecto de contenção de custos e eliminação de gorduras e desperdícios.

Zara ainda ia a discorrer, mas a curiosidade de Kuka era tanta que voltou a interromper.

_ E quê isso de gordura?

_ Gordura é tudo o que é a mais e pode ser eliminado nas nossas compras. Se um par de sapatos na caixa custarem mais do que deixar caixa e na mesma ter os sapatos, é um exemplo. Mas temos vários outros. É preciso gastar menos do que se ganha ou ter um equilíbrio entre o que se ganha e o que se deve gastar. Olha que o planeamento financeiro pessoal é um plano de acção que deve acompanhar a vida das pessoas em tempos como os que se avizinham.

_ Já viste, Zara? Estou a compreender aos poucos. Quer dizer que temos de pensar de forma antecipada e pensar melhor no que devemos gastar e como gastar? Devemos ser pessoas organizadas para ter sucesso financeiro na vida? Devemos fazer mais em menos tempo? Devemos obter mais gastando menos e evitar tudo que seja desperdício? _ O interesse e as perguntas de Kuka pareciam não ter fim.

_ Sim. É isso mesmo comadre Kuka. _ Confirmou Zara. _ Planear é administrar com excelência. Para começar, precisamos de colocar numa folha de Excel todos os nossos rendimentos mensais e listar todas as nossas necessidades que envolvam dinheiro e distribuir em percentagens, sem nos esquecermos de uma reserva para as imprevisões. Eu já tenho a minha folha e estou a exercitar a sua implementação. _ Explicou Zara.

_ E qual pode ser o efeito imediato disso, Zara? _ Voltou a indagar Kuka já mais familiarizada com o assunto.

_ Você vê, por exemplo, que só tem dez mil Kwanzas ao mês para a formação do seu menino. Com a distribuição de parcelas do orçamento por rubricas, terá de encontrar um serviço compatível com o dinheiro que tem. É mais um exemplo. _ Reforçou Zara. _Imagine que em sua casa vivam cinco pessoas e que bebam cinco garrafas de gasosa que custam mais do que um pet de litro e meio. Se comprar o pet fica mais em conta. Já viu?

_ Olha, colega, não precisas de ir mais longe na explicação. Obrigada pela aula. Vou começar por cortar os nossos dois nomes: Irei cada vez menos à Zara e usarei cada vez menos a Kuka. Os apadrinhamentos, as festas, os amistosos do seu compadre ficam todos com rubricas e só acontecerão esporadicamente, caso haja cabimentação. Também vou começar a procurar produtos alternativos para aqueles que estejam muito caros ou que sejam de duração muito reduzida. Sabes que barato, às vezes, também sai caro, nê?! _ Ironizou Kuka que estava muito feliz e pronta a transmitir os conhecimentos que obtivera às demais colegas de trabalho e à família.

_ É isso mesmo, Kuka, em tempos de crise nada melhor do que criar. É só retirar o "S". Comigo é: se há CRISE, CRIE! _ Disse Zara, já a entrar para o seu gabinete.

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Publicado pelo Jornal de Angola a 01.06.2025

domingo, junho 01, 2025

ALDEIA VIÇOSA: ONTEM E HOJE

A caminho do Uige, a faltarem ainda boas dezenas de quilómetros, montanhas e curvas todas (do Bengo) deixadas para trás, há uma aldeia, cujo nome desperta atenção. 

A ttopografia de altitude com vales aonde se fundam as aguas pluviais. A estrada parece rasgar um sopé. As casas foram esplendorosas num tempo que só os idosos sabem contar. Para as criancas e jovens deste tempo, Viçosa parece parada ou a andar (ainda) a passo de camaleão.

_ Ó filho, a aldeia começou a surgir somente assim. Vinha  colono e se instalava. Primeiro fazia fazenda. Ia buscar pessoal no sul para plantar café. Quando já tinha produção, ia buscar mulher e os filhos. Se fosse solteiro procurava já casar. Quando voltassem para a terrw deles vianham com mais alguem: o cunhado, o irmão, o primo, o condenado etc. Mas nós nãosabíamos isso de colonos condenados na terra deles que vinham aqui nos mandar como se fossem gente limpa. Só mesmo a cor deles de brancos é que nos atrapalhou até rebentar o sessenta e um. Como estava a explicar, a primeira casa era na fazenda. Começava pequena e depois fazia já grande, tipo no Puthu, com adobe quaimado e rebocado ou  mesmo tijolos da cerâmica e telha por cima. Quando os filhos já não podiam ficar na fazenda, por causa do estuso, começaram a construir casa na aldeia civilizada, aqui já. Depois veio mais brancos, mais brancos, mais brancos até Viçosa ficar assim (aldeia grande). Até o próprio nome, eles é que deram. Parece que havia nome igual lá no Phutu.

O meu narrador é um idoso de aproximadamente 80 anos que jura ter visto a "Viçosa crescer" e os brancos a enriquecer.

_ Eu trabalhava ali (apontava com a catana) para uma roça. Essa casa, aqui, que fizeram cantina, era a loja do Sô Paulo. Aquela tinha padaria. Aqui tinha muito "muvimento". _ Narrou o mais velho Mpevo para quem o declínio "começou no sessenta e um". O castigo dos brancos contra o mukongo era demais. O irmão Holden e outros irmãos do Miazaza começaram a luta. Ataque nas fazendas, contra os brancos e os trabalhadores deles do Sul. A tropa dos brancos veio acudir e começou a matar o povo que se refugiou nas matas, no Congo e outros se apostaram na Frente. Nenhum branco mais estava a aceitar vir se instalar e outros começaram a viver só nas vilas, até chegar a independência".

A aldeia Viçosa fica no caminho da antiga Carmona, cidade do Uige. 

Tirando tímidas novas edificações,  ela está praticamente "tal qual o colono a deixou", o que não deixa de ser um elogio.

No dizer do mbuta munthi Mpevo, "muita coisa desandou e nem sequer as pinturas, janelas, torneiras ou os pavimentos das antigas casas bistosas foram conservados e ou repostos". Apenas a Total vistoriou a Vila comunal e ergueu, de raiz, um posto de abastecimento de combustíveis que reclama ainda por energia da rede pública para conter os gastos com o gerador de energia que acciona as bombas.