A escola da aldeia de Pedra Escrita, no novel município da Munenga (região do Lubolu), possui três salas de aulas atendidas pelo igual número de professores que ministram aulas da iniciação à sexta classe.
Embora desde o final dos anos 70 aquela área tivesse sempre professores como José Borracha, Jorge Manuel Carlos e Zeferino Bernardo (seguindo-se outros em período mais recente), o que é caricato é que a produção de professores tem sido zero, com excepção do autor desta prosa que abandonou a região em 1984, ministrando aulas em outras paragens de Angola.
Os três "mestres" alocados actualmente naquela circunscrição são oriundos do Sumbe e Waku Kungu onde possuem as suas bases familiares. A consequência tem sido trabalharem 3 dias por semana, visto que descontam a segunda e sexta-feira para as viagens, restando a terça, quarta e quinta-feira. Pior do que isso, a aldeia não possui casas para professores e enfermeiros, passando-se o mesmo em relação ao Posto Médico que não atende aos sábados e domingos.
_ Os enfermeiros são da vila [de Kalulu] e só vêm na segunda para regressar junto de suas madames na sexta-feira. Acontece que a doença não escolhe o dia. _ Atirou o vice-soba da aldeia, em alusão ao fechamento das portas da unidade sanitária.
Mas, voltemos à escola. A meu ver, dois caminhos se podem desenhar para que aldeias como a de Pedra Escrita tenham autonomia em termos de professores e enfermeiros:
1- Um projecto gizado pela administração e comunidade que leve à selecção de seis a dez alunos locais que devem ser acompanhados e potenciados (psicológica e financeiramente) para que estudem até concluírem a 12ª classe e serem recrutados, posteriormente, como professores e enfermeiros locais.
2- Construção de casas de função para professores e enfermeiros, como forma de propiciar a mobilidade e instalação na aldeia de familiares de profissionais não locais, evitando-se as longas viagens e o absentismo ao trabalho.
Construir, nem que fossem apenas, 5 quartos com respectivos lavabos não seria uma empreitada impossível se a administração e a população estiverem a comungar ideias que levem a auto-suficiência e firmadas no futuro. Deve ainda haver no país gente solidária e com dinheiro que só precisa de receber bons e exequíveis projectos.
O professor Mateus António, 41 anos, é natural do Sumbe e trabalha na aldeia de Pedra Escrita há mais de seis anos. Comunga da ideia de que se a aldeia tivesse casa para professores, as suas idas à capital da província teriam diminuído, teria menos custos e a família podia repartir o tempo entre o Sumbe e a Pedra Escrita, admitindo mesmo a mudança de base familiar.
Falei-lhe e mostrei-lhe onde era a lavra do professor, no início dos anos 80 do século XX. Expliquei a minha própria experiência em que as manhãs de todos os sábados eram para a campanha escolar, dividindo os alunos entre as classes que faziam a limpeza da escola e cercanias e aqueles que iam à lavra do professor, pois este leccionava de segunda à sexta-feira e de manhã ao final da tarde, não lhe restando tempo para a horta. E todos íamos alegres à campanha.
_ Numa situação destas, ter casa, mesmo que fosse só um quarto, e um terreno para fazer uma horta, teríamos uma vida melhor. _ Desabafou Mateus António, esperançoso de que as minhas ideias e experiências "encontem eco e que alguém as oiça e materialize".
A propósito, a escola beneficia de obras (lentas) de restauro e os alunos e as carteiras "estão distribuídos pelas capelas do bairro", constituindo-se a adjacência da escola, envolto ao capinzal, em um defecatório público, dada a ausência da cultura de construção de latrinas.
A piorar a situação, em tempo de chuva, os dejectos são arrastados para a zona baixa onde foi construído o poço de água que acabou inundado. Como consequência, aumentaram as enfermidades, "destacando-se as tifoides, diarreicas e outras patologias causadas por parasitas", segundo o coordenador da aldeia que reforça que "a água que as pessoas consomem não tem condições sequer para tomar banho, devido a porcaria arrastada pela chuva e que inundou o poço que sustenta a aldeia".
Uma canalização, que retirava a água de uma montanha que dista perto de 3 quilómetros, foi esquartejada pela grade do tractor de um fazendeiro que, passados mais de 5 anos, ainda não foi responsabilizado a repor o bem público danificado, expondo a população a enfrentar dificuldades na obtenção de água própria para o consumo humano.
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Pedra Escrita, 25.01.25
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