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sábado, outubro 05, 2024

ATÉ JÁ, ISMAEL MATEUS!

(Espero que a leves esta carta como meu recado ao chefe que te chama a ir ter com ele, em vez de vir ressuscitado e instalar o seu reino)

Perguntaste-me, certa vez, "se eu era remunerado para escrever tanto para 4 títulos de uma mesma empresa jornalística".

Respondi que "não!". Expliquei-te que a escrita, arte a que me "empurraste", se tinha transformado em escapatória para divertir o jornalista que mora dentro de mim, visto que as funções que exercemos inibem-nos de fazer jornalismo". 

Abanaste a cabeça e soltaste um "se corres por gosto, coragem". Senti a tua mão longa e paternal no meu ombro e mais não disseste, nem com aquele teu sarcasmo. Dias a fio, fiquei a pensar, a pensar no tema que não tínhamos esgotado, mas os assuntos trabalhistas vieram à baila e era a camisola do trabalho que mais se metia à frente.

Ontem mesmo, 30 de Setembro, fiquei a pensar na carta a remeter à tal empresa a que mando crónicas desde 2017. O título seria até já!

 Até já porque nunca me despeço definitivamente de pessoas que posso voltar a ver (nessa ou noutra vida), assim como empregadores (no caso deles) que me possam vir a acolher em caso de necessidades um dia. Durante toda a madrugada, em cada despertar, depois de um sono e sonho mal conseguido, vinha-me à cabeça o até já!

Manhã cedo, levei a tua afilhada ao aeroporto e disse-lhe até já! na despedida. 

Não demorou, a Rádio Nacional, a tua primeira casa jornalística, ligou-me a perguntar se eu sabia do acidente que te subtraiu de nós e se podia negar ou confirmar. Bem gostaria de negar até agora. No mínimo fosse fake new e não te estaria a escrever essa carta.

Que dirás ao Pedro Menezes e aos que se adiantaram neste caminho doloroso, mas irreversível? Que contarei aos mais novos sobre ti?

Ligou-me o Paulo Sérgio, jornalista, a pedir que fale sobre ti Ismael Mateus Sebastião. Disse-lhe que me tinhas encontrado há 26 anos na LAC. Tu, um respeitado e já veterano, com folha feita e livros. Tuas crónicas, "Bue de Bocas", chegavam-me desde rapaz no Toshiba do meu pai, ainda no Lubolu. Depois que vim para Luanda, e na Luanda Antena Comercial, passei ouvir os "Recados para o teu chefe". Longe de te conhecer ainda caralmente, um dia, nem passares a meu mestre, mentor e padrinho. 

Tinha eu dois anos de LAC, em 1999, quando me descobriste de entre muitos. Nunca me disseste porquê, tirando os elogios de coisas bem feitas e a negação, quando te dizia, já adulto, que "tudo o que sou profissionalmente muito se deveu a ti". E dizias: "cala a boca, matuense. Foi tudo por teu esforço e obra". 

Será?!

Tornei-me no jornalista que as pessoas dizem que sou por tua descoberta, pressão, correcção e instrução permanente. Achavas que da "laranja seca" que encontraste naquela redacção podia nascer sumo". Quando te tornaste Secretário-Geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos, fui a voto e tornei-me delegado sindical na LAC. Depois, implementaste o Conselho de Redacção em que eu era "conselheiro", enquanto editor. 

Por tua sugestão fui à assessoria de imprensa em Catoca. Fazias questão de apelar ao esforço, ao mérito e sugerias pessoas que não te envergonhassem.

Quando criaste a TamodaEditora, inaugurámo-la com o meu "Manongo-Nongo". Em Maio, tentámos o "Lubolu & Arredores" que dizias "vai ser a 'reposição da legalidade'".

Depois de me teres apadrinhado esse tempo todo, informalmente, em várias esferas da vida, testemunhaste ao mundo como meu padrinho de casamento e me dizias: já não és miúdo. Se me chamaste é para teres juízo!

Faltou-me juízo para te deixar partir?

P'ra quê mais "bué de bocas" e tantos parágrafos neste "recado a Zezus", se nem mais te consigo contar um ka-segredo de filho para pai?

Até já, Ismael Mateus!


Post scriptum: 

Iniciei-me como colunista no teu "Cruzeiro do Sul", na primeira década deste século.

Há dois anos, quando lançaste a segunda edição de "Sobras da guerra", exigiste que eu fizesse o prefácio que tive de esboçar durante uma viagem à Espanha e entregue a faltarem minutos para o deadline. Como foste tão exigente e tão bom comigo, Ismael?!

1 comentário:

Soberano Kanyanga disse...

Publicado no jornal O País de 4 de Outubro de 2024