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terça-feira, maio 15, 2018

MADRES, ROUPAS, TELEFONES E REGUADAS

Na escola, roupas ou vestuário adequado, comunicações ou telefones (para os dias de hoje) e a (im)pertinência de reguadas são temas sempre presentes nas conversas formais e informais dos que labutam e frequentam instituições escolares dos primeiros níveis.  E, quando madres se juntam à escola, a "conversa" ganha mais vida.
Estive (28.02.2015) num colégio gerido por madres, ao Kikuxi, Luanda. Uma boa iniciativa que leva o ensino de qualidade e a bom preço ao museke. As propinas me pareceram modestas, quando comparadas com as praticadas por outros colégios, mas elas, as madres, foram claras em explicar que embora a criança matriculada "não seja culpada pela falta de pagamento dos pais, não devendo por isso ser convidada a abandonar a sala de aulas, a instituição tem trabalhadores assalariados" que devem receber pontualmente os seus ordenados.
A coordenadora da escola chamou também a atenção dos pais para que não viciem as crianças aí matriculadas com dinheiro e coisas extravagantes. "Há pais que dão dinheiro aos filhos. Levem o dinheiro aos pobres ou às cadeias", disse a irmã Leopoldina, realçando que outras crianças vêm com telefones muito sofisticados. "Não viciem vossos filhos com coisas impróprias para a sua idade", rematou a religiosa  que coordena a escola das madres, "S. José do Colouny" do Kikuxi. Para mim, são conselhos que se aplicam a todos os pais e encarregados de educação e a todas as instituições de ensino.
Ainda no campo comportamental, a cristã frisou que está a ser alarmante na  instituição a separação dos pais. "Além dos vossos motivos devem pensar nas crianças. Vemos que uma criança que lia já não lê mais. Umas já vêm sujas porque deixou de viver com os dois e agora está somente com um". Os pais, explicou, devem cuidar também da roupa dos filhos. Não devem usar roupas muito curtas, nem inapropriadas para uma escola (como essa). Vemos mãe e encarregadas de educação que chegam aqui com sainhas e decotes que não se recomendam, lembrou.
Já no fim, quando os pais e encarregados de educação conferiam com os professores o comportamento dos petizes, eis que me surpreende um senhor bem-falante e igualmente bem trajado defendendo castigos físicos aos alunos, comparando o seu tempo de escola com o hodierno. Eu era "um pato naquela ceia", fui apenas procurar o amigo Bernardo Bumba que tinha um cachimbo para me ofertar e enfeitar a minha banga de prosador, mas quase intervi para recordar-lhe das aulas do pedagogo Amós Komenius. 
Surra já era, senhor encarregado. A ciência demonstra que sem ela também se aprende e que violência gera violência. Os tempos mudaram. Senti vontade de lhe dizer tudo isso e mais umas coisas, mas quem interveio a seguir a ele explicou que era professor e que nenhum mestre mudo de pedagogia moderna recomendava as reguadas do "nosso" tempo de kapalandanda.
A "Maria das Dores" que tirava "lágrimas de sangue" ficou no século XIX (XX para nós nascidos antes ou na alvorada da Angola Independente).

Texto publicado no Caderno Fim-de-semana do Jornal de Angola, pag. 10, ed. 11.03.2018

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