Uma foto, encontrada no face book sobre a fabricação rudimentar de utensílios metálicos, algures na Lunda Norte, fez-me recuar no espaço e reviver o meu tempo de aprendiz de uma velha arte, a da manipulação do ferro em novos utensílios. Assim, revisitando o meu guarda-recordações, deparei-me com algumas nótulas.
Sempre que houvesse um acidente, capotamento por exemplo, sobretudo se fosse de camião, quatro peças do veículo em desgraça desapareciam num abrir e fechar de olhos, na primeira visita efectuada dos aldeões mais próximos.
1- O espelho: serve para manter a "boniteza" em dia. Já vi, mais antes do que hoje, casas adornadas com espelhos retrovisores de viaturas.
2- Cabos de aço flexível que suportam a embraiagem: esses atendiam/atendem uma das actividades económicas do homem do campo, complementar à agricultura e à pesca. A caça. Os laços e outras espécies de armadilhas para animais de médio porte são feitas com esse material de extrema raridade e importância no campo.
3- As molas em barras, também são de capital utilidade para a caça. Servem o ferreiro que, com ajuda do fole, forja as armadilhas (chamadas erroneamente po "ratoeiras"), os machados e machadinhos (nyanga ou kanjaviti), faças, flexas, laças, etc. Já servi de ajudante de ferreiro, antes de atingir a primeira década de vida, e manipulei quer o fole, quer a bigorna, o martelo, o alicate e outros instrumentos.
4- Finalmente, o veio de transmissão: tem uma parte tubular que não é ferro maciço. Essa, depois de cortada pelo ferreiro, vai atender a destilação da "makyakya", kacipembe ou caporroto (o nome varia de região para região), líquido que entorpece mas que devolve alegria aos aldeões depois de muito agricultar, pescar e ou andar atrás de presas que alimentam o estómago.
Cabo de aço flexível, molas em barras, espelho retrovisor e veio de transmissão são peças cobiçadas no campo. Saiba.
Texto publicado no Nova Gazeta de 10.11.2016
Texto publicado no Nova Gazeta de 10.11.2016