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sexta-feira, julho 13, 2018

ALUGA-CÊ CAZA DE CUARTO E SALA


Epá! No Cazenga, no Palanca e, sobretudo, na Vila da Mata e arredores são só lamentos e choros mesmo de babar ranho.
- Roubaram a nossa filda, que sempre foi nossa desde o tempo colonial, tempo de Agostinho Neto, tempo de José Eduardo e até tempo das rusgas dos PCU e ST, de cavalo e chicote na mão, a endireitar "bicha" de visitantes, de biscateiros e de carteiristas. As casas ficaram, sem portas nem janelas, mas a filda andou. - Choram.
As moças, bonitas de ocasião e de um Português que denuncia o lápis desafiado, ficaram penduradas.
- Quem qui vá nos dá dinhero pá matabichá? Quem? Nossos portuga lhis levaram longe porcá di quê?
Mano Rafael, força de elefante, conhecido na rua da conduta como "Faz Tudo", tinha já o seu kangulu preparado, desde que ouviu o anúncio na radio "filda começa dia dez e acaba sábado, catorze". Na sua cadeira de fitas, à moda 80, pensou:
- Desde que Luanda é Luanda, toda a filda é no mesmo local.- Oleou o eixo, depreende os músculos e os preparou para a labuta vizinha.
Aliás, para ele e para muitos, FILDA é local, tal como esteve grafado até há bem pouco tempo nas instalações que se enfiam entre a frescangol e a BCA, deixando infiltrar-se no meio a Deolinda Rodrigues de Catete. Filda noutro lugar que não seja no da FILDA é impensável em muitas cabeças.
Faz Tudo, "pensamentoso", não sabe se vende a casa na Vila da Mata, para arrendar outra nas proximidades da Zona Económica Especial ou se deixa o ofício de biscateiro.
- E, se ano que vem, o Estado decide levar a feira para outro lugar, a pessoa fica gira-bairro por causa do biscate de uma semana?
Na sentada com Mangololo, outro kipá dele das couboiadas, a conversa ficou a rolar meia hora, parecia disco riscado de sungura antiga. Mangololo era pela mudança imediata do bairro e seguir a exposição. Argumentava que em uma semana o biscate na Filda dava mais dinheiro do que onze meses.
Faz Tudo, a pensar pensamento de homem, não se deixou dobrar pelo argumento simplista do amigo.
- Esse Estado é "fodido". Assim que lhe aborreceram aqui na FILDA, com o roubo e desmantelamento de quase tudo que o colono deixou, se lhe aquecem a cabeça, lá na Zona Económica, pode levar a exposição para Catete ou Funda. Assim a pessoa fica andar à toa nos mabululo onde não há biscate nem de desentupir fossa ou consertar fogão?
Foi isso que o travou, mas o amigo dele, Mangololo, já tinha colado papel quadriculado na porta do chimbeco e forçado Minga dya Mbaxi, a mulher, e os twana a arrumar as imbamba.
 - Aluga-cê essa caza de cuarto e sala. - Lia-se a bom rir dos mizangala mais acanetados da Vila da Mata.
- Ó ti Mangololo, alugar não é com cê de cebola, é com esse de sapato, depois de aluga. - Tentou emendar a sobrinha Kabwiza que estudava a terceira classe na explicação do Tony Mulato.
-Cala-te boca, mijona. Quando entrei na escola nem a burra da tua mãe tinham lhe engravidado, pá. Se as pessoas estão a perguntar preço é porque leram e entenderam. Você, tua casa está aonde, pá. Vai só mazé me comprá cigarro e não me mete mais atrapalhação nas ideias. - Resmungou malicioso.
Ele, mano Rafael Barata, homem alheio de Malanje, foi a casa dele de sofrimento que o prendeu. Decidiu consertar sapatos até que a filda volte à FILDA. Quem sabe um dia?!


Publicado no Jornal de Angola de 05.08.2018

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