A paz de Bicesse, 31 de Maio 1990, tinha permitido realizar as primeiras eleições em Angola, de 27 a 29 de Setembro de 1992, classificadas como livres e justas.
Eu estava inscrito no Instituto Nacional de Petróleos e, em Janeiro de 1993, deveria ir ao Sumbe saber dos resultados e eventualmente estudar Geologia e Minas.
Em Dezembro de 1992, desloquei-me à Pedra Escrita, a fim de pegar um saco de macroeira que me permitiria comprar roupas novas e sapatos para aguentar o ano lectivo. No segundo dia da minha estada por aquela aldeia, que tinha a Unita sempre por perto, fui alvo de uma emboscada.
Eu trajava calças jeans blue, camisola da CNE e, por cima, um casaco avermelhado. Os homens que haviam negado a lisura do processo eleitoral e os seus resultados, terão chegado à aldeia no dia anterior e acompanhado todos os meus passos.
Eu ia à lavra, a pé, acompanhado de dois rapazes, meus paarentes: o Segunda Africano e o Daniel.
Na primeira descida, em direcção a Luanda, EN240, a olhar para a pedra, os homens saíram da mata. Crá-crá. Bala na câmara.
- Mãos ao ar.
Obedeci. Um esboçou posição de atirador. Deu uns passos à recta-guarda.
- Ainda tira o casaco. - Ordebnou arrogante.
Obedeci sem me acobardar.
Veio outro para reparar ao detalhe as inscrições na camisola, tendo anunciado depois:
- Ainda pensamos que era a cara do "Enduarto Sando". Se era ele, íamos disparare só na "fodografia" que está no peito. Ainda o maninho pode ir na (à) lavra. Mas se te darem camisola do "Enduarto Sando" nó usa. Doutor Savimbi não lhe gosta!
Quase ri. Estava já avisado que, embora tivesse propaganda do MPLA, não devia exibi-la naquele território. Um dos putos que me acompanhava não conseguiu conter o mijo. Fê-lo nos calções. Era tanto o medo que a presença dos homens e aquela acção impunham.
Segui o meu caminho, atrevido como são os adolescentes e os jovens de primeira viagem, até à lavra onde me encontraram, horas depois, para mais provocação.
Chegaram uns miúdos, FALA pequenos, irrompendo sobre a horta. Eu cuidava do bananal. Gosto de bananas e aprendi a cuidar de bananeiras. Os miúdos armados de kalachenikov pediam tudo o que viam: cana, mamão, mandioca, bombô demolhado, banana, etc. Quando eu ia já ficando fulo, a minha mãe apareceu e deu o que queriam. Ela leu o cenário mais cedo.
De regresso à aldeia, coloquei umas tantas canas na bina que me fora emprestada por um primo. Pelo caminho, fui novamente interpelado pelos kwaca (Unita) a pedir cana e demais produtos. Sabia que pretendiam um subterfúgio para lançarem toda a sua ira contra mim. A contragosto, não ofereci resistência.
Posto em casa, aturaria outras humilhações, pedindo que eu e tantos outros "kinangambala" fossemos catar lenhas para a sua habitual fogueira nocturna.
Para escapar, tive de me socorrer das que a mãe tinha na sua cozinha
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