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quarta-feira, janeiro 22, 2020

O "RAPTO" DA MULHER

(de Mangodinho)
O contar, de boca em boca, do ocorrido na capela católica fez de Mangodinho a figura central, rivalizando mesmo com a prima Adi e o noivo Victorino. Todos, mais de duzentas pessoas, que foram à festa de casamento procuravam saber por Mangodinho.
- Quenhêle? Me mostrêle, o homem a quem o padre negou a hóstia na cerimónia religiosa. - Pediam aos primeiros a chegar ou aos que tivessem assistido à cena.
- Tal é aquele. - Apontavam, com ou sem gestos.
Mangodinho, cada vez mais Bangão, como quem diz, "aqui, nem mesmo o tio que é comissário de três estrelas, é mais famoso do que eu", continuou, fanfarrão, o seu desfile pelo salão. Ora com o copo carregado na mão, passando de mesa em mesa, ora de palito na boca se espalhando pela pista de dança. Mangodinho, era só ele.
Às três da manhã, quando boa parte dos convivas mais velhos já se tinha retirado e a festa entregue aos jovens e adolescentes que entornavam doses de álcool sem receio de um "Xê miúdo(a) não bebe assim, tipo te estão a dar corrida", Mangodinho já não era pessoa.
Saído do urinol, perdeu o sentido de orientação e não conseguiu localizar a mulher que continuava a fazer companhia às garrafas vazias e pratos de bolos e outras guloseimas por comer.
- Isabel? Isabelêê?! - Gritou sem resposta.
Tentou umas voltas, mas as pernas deixaram de obedecer.
- Tio, faxavor. Temos uma situação grave aqui no salão.
O tio que se despedia de um colega da corporação, pousou o copo de água e virou-se para ele.
- Que se passa Mangodinho?
- Tio, faxavor, aciona só o patrulheiro. É mesmo verdade que estou a falar.
Já quase a perder paciência, o tio pegou-lhe pelo braço, como quem dirige uma criança, e rematou:
- Ou te explicas ou mando te levar à casa. Vamos, diz lá seu sacana. O que se passa, pá?
- Tio, é mesmo verdade. Raptaram a minha mulher!
- Mas ela é raptável? - Indagou o tio, levando os olhos à mesa onde se encontrava a senhora, já sem o brilho da mocidade.
- Seguranças, por favor, chamem o patrulheiro. - Solicitou o tio.
Mangodinho pensando que os polícias haviam sido chamados para atender a sua preocupação, foi carregado até à arrecadação, onde dormiu como pedra até ao meio dia seguinte. Quando acordou, nem a mulher, nem o tio, nem os parentes, nem os convivas. Era apenas ele no meio de tralhas.
Na foto: Soberano Kanyanga e sua Milika (25.05.2019)

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