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quarta-feira, maio 29, 2019

NO AERO HOSEA KUTAKO

- How are you (como está)? - Perguntou a jovem do atendimento aos passageiros para emissão da passagem e pesagem das malas e outras imbambas.
- Estou bem, obrigado. And you? - Retorqui, usando a minha habitual língua e experimentando a alheia.
- Brigado. - Respondeu a jovem, 19 ou vinte anos aproximadamente, a olhar para a ferrada fisionomia e curiosidade em aprender "port'angolês".
- Luciano, good name. Are you going do Cabinda? (Luciano, bonito nome. Va...is a Cabinda)? - Voltou a questionar.
- No. Im going to Luanda. Cabinda is far away (Vou a Luanda. Cabinda fica longe). - Respondi-lhe abrincar.
- Até cabinda's people white (Os cabindenses são brancos)? - Voltou a questionar, curiosa.
- No. Cabinda is north of Angola, near Republic of Congo. They are Black (Não. Cabinda é norte de Angola, próximo da República do Congo. Eles são também negros). - Expliquei, ao que a jovem ficou mais curiosa ainda.
- But they look like white. Use then skin cream (Mas eles parecem brancos. Será que usam creme para clarear a pele)?
- Sim, filha. Isso mesmo. Alguns se paculam, mas não são todos. - Respondi, desta vez em "port'angolês".
- And what's paculam (o que é paculam)?
- Its mean that some of then use frequentely cream to clear the skin (significa que alguns usam creme para clarear a pele).
- Thank you mister Luciano. Good trip to Angola (obrigado, Sr. Luciano e boa viagem a Angola)...
Durante a viagem fiquei a "banzelar" no avião. O que levou a moça namibiana a me confundir com os paculados, mesmo depois de ter levado com o sol de Whindoek nas caminhadas matinais de todos os dias durante uma semana?
Pela próxima digo-lhe as respostas que me ficara pela garganta.
- Im from Libolo and we don't use paculation! Those people that use paculation left our contry by Bitcheket post border, in Cabinda, going to RDC (eu sou do Libolo e não uso creme clareante de pele. Aquelas pessoas que se paculam e que dizem ser angolanas de Cabinda, abandonam o nosso país pelo posto fronteiriço Bitchekete, em Cabinda, rumando ao Congo Democrático)!


quarta-feira, maio 22, 2019

DESTIN'OESTE

(Windhoek)
Desde que frequentei a quarta classe (1986/7) que interiorizei, de muitas, uma certeza: caminhar para oeste basta ser levado pelo sol. O caminho é onde ele se dirige, deixando que, de manhã, lhe bata ardentemente às costas e, quando já ele se posicionar à frente, lhe ofusque a visão em confronto directo. Foi o que fiz nesta quarta etapa de "descobrimento e comparação" da cidade dos Warriors à nossa "quadricentésimo, quadragésimo sexto aniversariante".
 Partindo, como sempre, do centro, marchei em direcção à Dr. David Hoseia Meroro Avenue que nos leva a Westline. Há também um shopping por lá. Quando já se viam poucas casas (abro parêntesis para dizer que não vi construção precária, nem desordenada como as nossas cubatas de chapas), apanhei a Avenida Circular que parte do sul ao norte e que nos leva a Khomasdal e Okahandja, fazendo, à direita, um ângulo inferior a 90° para não colidir com o sol que me fustigava ardente.
Quase sem rumo pré-determinado (andando apenas por andar), fiz-me àquela percorrida rodovia, deixando para trás várias estradas perpendiculares de bom recorte técnico-arquitectónico e drenagem.
Outro detalhe: os canais pluviais estão sempre limpos e com cobertura vegetal. Nem mesmo nos "mabululos" da cidade ousam depositar descartados nas passagens hídricas como acontece na nossa banda.
 Já próximo de Khomasdal (menos de meio quilómetro) e quando mais adiante da rodovia os olhos só me mostravam montes cobertos de vegetação espinhosa, decidi apanhar uma perpendicular que me parecia rumar à cidade. Era a Dr. Kuaima Rikuako Street e eu já levava nas pernas mais de dez mil passos marcados ainda com vigor.
 Confesso, depois de 1990, ano em que os namibianos deixaram Kabuta (Libolo) para virem votar e proclamar a sua independência, nunca mais tinha andado tanto. Uma média de dez quilómetros ao dia, sendo sete dias consecutivos.
No ano da independência deles, a causa foi o ataque da guerrilha (que tem nome) à vila de Kalulu, quando festejámos o natal de 1989. Depois foram caminhadas longas e extenuantes: Kalulu-Mussende-Munenga-Pedra Escrita-Kuteka-Pedra Escrita-Munenga (felizmente, na última etapa, o chefe Gika levou-me na sua mota até Kalulu, aonde, em Março de 1990, fui para terminar a sexta classe, no ano lectivo 1989/90).
Desta vez é mesmo caminhar por gosto e nem sei se já percorri tanto assim uma outra cidade, perfurando-a pelos quatro pontos cardeais, ponta a ponta.
 A partir da rua Dr. Kuaima Rikuako, já sem o vigor inicial, pois tinha também a sede como adversária, para além do sol que passei a encarar frontalmente, fui pensando na fluidez do trânsito automóvel nesta cidade. Quem não anda e não se apercebe das várias artérias circulares e perpendiculares que a cidade e seu entorno possuem, pode alimentar a ideia de que "a cidade não regista engarrafamentos como os nossos porque tem poucos carros". Seria ledo engano. O que a torna saudável e com um trânsito que corre como sangue num corpo jovem e são é a quantidade e qualidade de artérias. Há muitas viaturas circulando sem cessar, pelo menos durante o dia, mas há avenidas, ruas, ruelas e travessas bastantes para que tudo aconteça sem stress. Não há, à beira das rodovias montículos de areia varrida mas nunca recolhida e que volta a espalhar-se pela estrada e entupir as sarjetas, como acontece na nossa Luanda. 
Outra constatação é o facto de se poder caminhar em toda a sua extensão. Será que podemos ainda nos alcandorar a chegar a esse patamar?
- Podemos! Porém, tal como as coisas estão na banda, só chegaremos a esse desiderato com medidas enérgicas e bastante corajosas. Não nos devemos dar por felizes tendo casebres de chapas erguidas sobre rodovias, como acontece nos Zango e noutras paragens. Não nos devemos sentir cómodos com o crescimento desordenado das cidades, sem macro-drenagem, sem que a construção das casas seja fiscalizada pela autoridade competente e sendo ocupadas antes do seu término.
Para mudar o cenário de Luanda, precisamos de aprender com os outros, mesmo sendo "mais novos", ao risco de nos contentarmos a ser comparados, ad eternum, ao vizinho do Nordeste.

Publicado pelo jornal de Angola a 24.02.19

quarta-feira, maio 15, 2019

OS NINGOÇUS À VOLTA DE UM NEGÓCIO

Considero negócio a actividade formal cuja prática, em local apropriado, é reconhecida, geradora de emprego, sustento e imposto para o Estado.
Ningoçu é toda a cadeia informal de negociatas e biscates que possam surgir à volta de uma actividade formal.
Assim, tendo decidido ir desmaiar a fome no "restaurante aberto" da Chicala, ao istmo de Luanda, onde se vende peixe fresco e grelhado, notei, com atenção, a quantidade de pessoas que se movi...mentam naquele espaço, procurando levar "pão para casa" ou, no mínimo, saciar vícios resistentes, mesmo em tempo de crise financeira reconhecida e assumida.
Dentre as "ningocistas", pude anotar: a senhora da jinguba e a do jola myongo; o moço dos discos de música, pen drive, acessórios eléctricos, etc; o rapaz que lava o carro; a interceptadora de possíveis clientes dos "restaurantes"; a mamã do Tpa (sobre ela já dediquei uma crónica); o tio do mictório; o vendedor de kangonya aos pescadores, lavadores de carros e estivadores; a mana que vende bebidas que nada têm a ver com a vendedora do almoço; o rapaz das recargas telefónicas e da graxa para que o funcionário público (normalmente bangão e com ares de bem remunerado) chegue ao local de trabalho com sapatos feitos espelho, dando a entender que sai de um dos restaurantes mais chiques da cidade... São "n" NINGOÇUS.
Feita a observação, algumas perguntas não se fazem calar.
- Por que também não se transformam esses ningoçus em negócios, abrindo esses pequenos serviços periféricos onde se fundem os negócios típicos da cidade?
- Por que não ter um parque para estacionamento e lavagem automóveis em que se pague pela limpeza e segurança?
- Por que não se colocam espaços para a venda estacionária e não ambulante de souvenirs e acessórios diversos?
- Por que não se instalam, mesmo que em regime de franchising, quiosques representando as empresas de telecomunicações ou, no mínimo, seus produtos?
- Por que não se aglutinar aos "restaurantes de peixe" tabacarias, cafeterias e demais serviços úteis?
Teriamos pessoas a se orgulharem de ter um emprego ou de ser empresário, estadas mais cómodas para os frequentadores, mais impostos para o Estado e garantia de um futuro melhor para todos.
São apenas ideias de leigo.


Publicado pelo jornal Nova Gazeta, 31.01.19
 

quarta-feira, maio 08, 2019

CONVERSA ENTRE VELHOS COLEGAS

 
Na Avenida Agostinho Neto, estendi o meu olhar à "Angolan House" com a sua bandeira baixada à meia-haste pela acção incessante do vento.
Sem paragem concreta, segui a Jan Jonker Street, passando pelo "Maerua Mall". Segui, sempre em frente, até encontrar a linha férrea e, com ela, continuei até ao cruzamento entre a Jonker e a Sam Nujoma Avenue. Já não havia cidade a Leste. Apenas montes recheados de arbustos espinhoso, como é natural por essas bandas.
O regalo foi mesmo ver uma cidade de 130 anos, projectada sobre colinas que drenam com imensa facilidade as águas pluviais. É como a nossa cidade do Dundo. É com ela que mais se parece/parecerá a cidade dos bravos (warriors). Vivendas, maioritariamente, e poucos edifícios a desafiarem os céus, contrariando as capitais costeiras que crescem em altitude. Aqui, dizem eles, "há terrenos bastantes para construir em extensão"
De volta ao centro da city, passei pelo National Botanic Garden, até cruzar com a Robert Mugabe Avenue. Mas não contente ainda, segui, um pouco mais a baixo, até encontrar a Avenida da Liberdade e inflectir para norte, até ao Ministério da Igualdade no Género e Proteção da Criança. É assim que se chama o MISFAMU deles. Estavam completados os 10 mil passos que são o propósito diário da caminhada.
Surgiu, então, um novo desafio que era o de elevar essa fasquia (10 mil passos/dia) como média semanal. Ora, no domingo e segunda-feira não tinha passado dos três mil passos. Precisava, por isso, de mais 5 mil passos. Olhando para o pôr-do-sol, marchei uns metros até à Avenida Mandume Ndemufayo (próximo do shoping Vernhill) e inverti para sul, fazendo mais 4 mil passos, até à Autoridade Rodoviária. Aqui, o "INEA deles" parece ter mesmo autoridade pois as vias estão bem conservadas. Pelo menos melhor do que as nossas.
A parte final foi marcha inversa, na mesma Mandume Ndemufayo, em direcção à baixa (Vernhil.). "Varridos" o norte, sul e leste da cidade,  restando-me apenas o pôr-do-sol, pus-me a pensar no que seria a conversa entre velhos amigos de escola.

- Quem me dera que pudesse também, com a mesma facilidade, percorrer as ruas da minha Luanda onde, nos dias que correm a conversa imaginária (tantas vezes real) pode ser essa:
. Epá, lembras-te daquele wi, com facas na cara, que foi nosso colega no IMEL?
. Yá,o Star.
• Star ou Kanyanga?
• É o mesmo wi. Chamávamo-lo por Star. Não é quele que amarrava bwé?
• Yá é o mesmo.
• Mas é o que então?
•Fogo, vi o gajo a andar bwé a pé e a "caloriar" p'ro caneco. Temos que "lhe" fazer uma kixikila. O mwadyé tipo está frustrado ou a sofrer. Tipo perdeu emprego ou coisa parecida.
•Mas, ó wi, estás mesmo a falar do Star? Só pode ser brincadeira. Ele gosta de caminhar. Deixa o popô na baixa para evitar que a barriga lhe roube os músculos das nádegas.
•Aié, então pensei a toa do brother. Mas que estava a caloriar, estava!
Em Luanda, seria essa a conversa de bar entre velhos colegas.

Publicado no Jornal de Angola de 02.06.19

quarta-feira, maio 01, 2019

OS SINDICATOS E A ÁGUA PARA POUCOS

Conta-se que nos Congos (Belga e Leopoldoville), o MPLA, avisado que a luta sindical era uma poderosa arma para dignificar o trabalhador angolano e combater a exploração do homem pelo homem, "andou" sempre (desde 1963) de mãos dadas com a sua Unta do camarada Pascoal Luvualu, servindo para “mobilizar e organizar os trabalhadores nas zonas rurais e os refugiados nos Países limítrofes para apoio político e material à Luta Armada de Libertação Nacional”.

Chegada a independência e proclamada a República Popular de Angola, a Unta continuou a sua acção de força mobilizadora dos trabalhadores em prol do Partido e dos ideais políticos delineados por este para o novo país, pois, “no período de 1977 a 1991, UNTA e os Sindicatos nela filiadas afirmaram-se como uma organização de trabalhadores que, sob orientação do MPLA-PT, desempenhou um papel decisivo na construção das bases materiais e técnicas da sociedade, que acabava de surgir”.
 
Assim, com esse casamento "ideologico-trabalhista" alguma pequena burguesia terá ficado "sem alguns caninos ou mesmo molares" e as reivindicações confinaram-se aos apelos alegóricos, no primeiro de Maio, onde os "proletários" de todo o mundo (pessoas que nada mais podiam dar ao Estado senão a capacidade de procriar/prole) eram chamados a unir-se em prol de "um salário que já não comprava" ou uma causa que reclamava inovação.
Com o mono-partidarismo e mono-sindicalismo, chegámos a 31 de Maio de 1991, data em que foram assinados em Bicesse, Lisboa, os acordos que poriam fim à guerra civil e ao mono-partidarismo, acontecendo antes a revisão da então Lei Constitucional que respaldou tais mudanças.
Veio o cessar-fogo, pluripartidarismo, liberdade de pensamento, de expressão e de imprensa, liberdade sindical, etc. e mais alguma coisa. Se o Partido governante ganhou concorrência, também à Unta se juntou a CGSILA de Manuel Difuila, ex integrante da Unta, trazendo nova pulungunza ao campo das reclamações e exigências para uma vida menos indigente para os trabalhadores.
Os rótulos, quanto às aproximações politico-ideológicas, não faltaram e ainda vão surgindo aqui e acolá, tendo em contas as colagens e descolagens dos líderes sindicais e partidários. É a História com um pouco de estórias.
Quanto ao hoje importa reflectir, nesta nova era da “governação lourencista”, são as frequentes ameaçam paralisações, fundadas em exigências cabíveis ou descabidas no bolso do patrão que só (des)encaixa dividendos com o trabalho (não) realizado pelos trabalhadores reclamantes.
Ao que me vai chegando aos ouvidos, parece estarmos a voltar aos anos da abertura ao plurissindicalismo, em que, por tudo e nada, se partia para a "arma mais violenta do trabalhador", a greve. E, mais preocupante do que isso, a meu ver, são os relatos sobre a existência de duas a três comissões sindicais em algumas empresas, revezando-se na apresentação de pautas reivindicativas, sendo os mais extremistas aqueles sindicatos criados no “pós-cisão” da União Nacional dos Trabalhadores Angolanos. Há mesmo, segundo relatos que me chegam ao ouvido, empresas em que uma dada Comissão Sindical diz ao patrão que "estão cientes da fraca produção ou recolha de receitas" e, por isso, atestam continuar a trabalhar para fazer crescer a organização e, com ela crescerem juntos social e salarialmente, enquanto outra comissão sindical declara "guerra" ao empregador, sem saber se trabalham ou não o suficiente para que a empresa possa atender ao que se exige. Provavelmente, isso explique, por exemplo, que algumas cidades (como o KK) estejam divididas em "lado da UNTA e lado da CGSILA ou outra Central Sindical", a contar com o facto de algumas ruas possuírem água e outras enfrentarem uma seca prolongada.