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quinta-feira, outubro 29, 2015

A HORA DA GOVERNAÇÃO ELECTRÓNICA

 
Era hora de almoço. No serviço, uma repartição pública da cidade alta do Huambo, Job Katende e seu amigo Manuel Duas Horas falavam sobre os avanços tecnológicos entre o cruzamento dos Séculos XX e XXI e as dificuldades e resistências que ainda se verificavam nas Organizações do Públicas e também em algumas privadas.
- As máquinas de dactilografia fizeram o seu papel, tornando legíveis, padronizados e ágeis processos de elaboração de documentos institucionais. Depois vieram as máquinas electrónicas, programáveis, rápidas e com um output mais vistoso. Quem não se lembra de como eram tão lindos aqueles documentos processados numa máquina movida a impulsos electrónicos e que ficava a meio caminho entre a velha máquina mecânica de dactilografar e a moderno computador? – Atirou  Manuel Duas Horas, com o garfo entre a boca e o prato de pirão.
Ainda hoje me fazem saudade. - Interrompeu Job Katende, regressando às memorias com já meio século de tamanho. O Governo Electrónico deve ser um caminho para ultrapassar os problemas que estamos com ele. Pode não ser longo, até porque hoje o maior inimigo do homem é o tempo e o melhor amigo é a tecnologia. – Reconheceu puxando o colega para mais dissensões a respeito do assunto em pauta. Era hábito entre os dois buscarem uma conversa inovadora e actual para regar os manjares.
- Pois é, mano Manuel, retomou Job Katende. A adopçao da Governação  Electrónica deve ser um plano institucional com etapas bem delineadas, com recursos, capacitação do capital humano em todas as frentes da pirâmide hierárquica, e sobretudo, exige mentalização do liderança da organização. Não pode ser chamada ou evocada apenas para fazer frente a falta de papel, tonel e tinteiros, quando as pessoas não têm computadores nem usam Outlook, quando algumas organizações correm para século XXII e umas ainda teimosas no século XX. Não se deve falar de Governo Electrónico quando na mesma organização uns navegam na internet e outros nem à velha máquina sabem dactilografar. É preciso saber que o governo electrónico das empresas requer uma mesa e uma cadeira por pessoa, uma máquina que se deprecia com o tempo, mesmo que aparentemente pareçam estar em condições. Essa crise que estamos com ela passa. A crise vamos combater com inteligência, chamando soluções adequadas a cada momento e circunstâncias. Porém, chamar soluções para as quais não se esteja estruturado pode ser paradoxal. 
 
 
Mal Katende terminou o seu rosário, a sala viu entrar Nkosi Mwenaxi, especialista em tecnologias de informação a quem sempre se recorria quando o assunto fosse internet e conexos.
- Boa tarde Mano Nkosi, já sabe que andamos sempre a tertuliar para empurrar o pirão quando o almoço é em branco. Sinta-se convidado à nossa mesa e a água fica já sob nossa responsabilidade. ‘ Convidou Manuel Duas horas ávido de mais conhecimentos sobre Governo Electrónico que só há poucos dias começava a entender, deixando de o confundir com a estrutura política que rege a organização e gestão do Estado.
Atento e interessado no assunto, Nkosi Mwenaxi começou assim a sua preleção: numa era de carências, as mentes são chamadas à exercitação diária para afinar-se mecanismo e se encontrar vias expeditas que permitam o andamento da engrenagem administrativa. Sem recursos nalgumas organizações para a compra de insumos administrativos como papel, tonel, tinteiros, combustível e outros materiais de reposição permanente, a palavra Governação  Electrónica é evocada de hora a hora e sempre que os procedimentos tradicionais de elaboração e expedição de documentos se mostre impraticável.
O que é então governação electrónica e qual é a demanda da governação electrónica?
O bloguista moçambicano Viriato Caetano Dias, na sua pág: http://macua.blogs.com/moambique_para_todos, afirma que a Governação Electrónica não é mais do que o uso das novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no sector público e não só (...) para a melhoria de vida (das organizações) dos cidadão e do país em geral.
Segundo o mesmo autor, a aposta na Governação Electrónica, entre os mais diversos objectivos realizáveis, visa:
» Proporcionar o acesso universal à informação a todos os cidadão e funcionários  para melhorar o seu nível e desempenho profissional (administração, educação, ciência e tecnologia, saúde, cultura, etc.).
» Criar uma rede electrónica do Governo que concorra para aumentar a eficácia e eficiência das instituições do Estado e contribua para a redução dos custos operacionais e melhoria da qualidade de serviços prestados ao publico”.
Remete-nos também à ideia de facilitar o cidadão na interação com as instituições do Estado e outras, proporcionando informação adequada e actualizada aos contribuintes, disposição de bens e serviços aos utentes, através de redes cibernéticas ou portais que facilitam a informaçao, acesso aos serviços, usufruto e prestação de deveres e obrigações como o pagamento de coimas, escolha de representantes, constituição de organizações, etc.
Para a materialização dos pressupostos acima elencados torna-se necessário suprir quesitos como: equipamento, modernização, manutenção e capacitação do Capital Humano.
- O quesito equipamento remete-nos ao apetrechamento das instituições com tecnologia electrónica para dar vasão ou  fluidez aos processos. Computadores, impressoras, data shows, scanners, instalações para trafegar as informações, softwares, servidores, contas de e-mail corporativo (informação institucional não deve ser trafegada em caminhos alheios) entre outris, são imprescindíveis para que haja uma cultura de governação digital.
- A modernização tem a ver com a atualização dos equipamentos e programas cujo dinamismo de evolução não pode ser ignorado. Torna-se necessário que as organizações estejam a par da revolução tecnológica, não ficando distanciados dela, pois programas e máquinas em desuso podem complicar mais do que facilitar ao não corresponder com os exemplares modernos nem reagir no tempo e performances deles esperados.
- A manutenção é o pilar da durabilidade e fiabilidade: programas de combate às invasões virais, manutenção preventiva e reativa dos hardwares, testagens dos sistemas operativos, entre outros, devem ser permanentes para que não haja estrangulamento na recepção, processamento e saída de informações ou dados.
- Capacitação: para além da autossuperação, as pessoas e organizações a que o Capital Humano pertença têm de estar envolvidos em planos e programas de capacitação e refrescamento contínuos em TIC. Como conceber a Governação Electrónica numa organização em que haja pessoal administrativo sem conta de e-mail ou que ignore as vantagens da internet?
Podíamos elencar outros elementos, mas esses bem servem para uma reflexão preliminar. A todos eles se deve agregar o Capital Financeiro que é de extrema utilidade e condicionante.
Sendo que a necessidade nos impele a pensar fora do comum, uma vez aqui chegados, é tempo de despertar os assessores, consultores e orçamentistas para o exercício de uma magistratura de  influência positiva junto dos decisores de topo para um olhar mais atento e  agregador aos factores que podem ou não alavancar uma eficiente Governação Electrónica nas organizações públicas e privadas: é necessário investir em materiais informáticos, seguir a sua evolução, desmobilizar o  equipamento com vida útil vencida, investir em programas ou softwares de protecção, proceder as manutenções preventivas, actualizar os softwares, substituir os periféricos que se tenham avariado, etc. É desta forma que as organizações afectadas pela crise financeira ultrapassarão a crise de resultados laborais. Mesmo em agricultura, as boas safras muito dependem da forma como as campanhas agrícolas são preparadas e como o plantio foi seguido ao longo do seu crescimento. – Antes de terminar a sua preleção, Nkosi Mwenaxi que já tinha feito antever o fim, foi agraciado com uma estrondosa salva de palmas e assobios pelo auditório, ao que se despediu com um: Boa reflexão!

quinta-feira, outubro 22, 2015

A SAUDADE QUE BROTA DO EMPENHO

- Por que, quando estamos em gozo de licença,  só a minha irmã recebe chamadas de colegas e do chefe a consultarem algo sobre o trabalho, se somos colegas? Por que só a ela as pessoas dizem "sentimos muito a tua ausência", quando voltamos ao serviço, findas as férias? - As perguntas de Njamba pareciam infinitas.

 Njamba não é uma jovem que sinta inveja da mana, mas a vida profissional, depois de toda a infância e adolescência juntas e recebendo dos pais e comunidade tratamento idêntico, faz delas, hoje, pessoas distintas, embora muito parecidas fisicamente.

Njamba e Ngeve, gémeas verdadeiras, sempre confundiram os colegas nas escolas em que frequentaram o ensino primário, médio e superior. Sendo duas raparigas de pele bronzeada e músculos torneados, as manas faziam-se passar, quando quisessem, uma pela outra sem o mínimo de desconfiança da "vitima". No banco e nos exames de recurso, que o digam os funcionários e os professores?!

- Njamba ou Ngeve? - Questionavam os mestres na academia.

- Sou eu mesma. A minha irmã dispensou o exame  - Defendia-se quem estivesse na condição de examinanda.

Houve vezes que que cada assumia seus actos singulares sem usar a falsa identidade. Porém, a pergunta "Njamba ou Ngeve?", só para confirmar, nunca se fazia ausente. Elas, com o "maior a vontade", sempre no ataque: sou eu mesma (Njamba ou Ngeve que escolhesse o questionador).

Depois de formadas, com sucesso académico, em Administração de empresas, as "manas parecidas", como também eram conhecidas concorreram à Função Pública tendo, novamente, a sorte as acolhido. Ficaram aprovadas e, mais uma vez, ficaram juntas no Departamento de Intercâmbio onde Ngeve se destacava com a sua entrega abnegada e criatividade, enquanto a irmã Njamba era mais dada à lide caseira e a pequenos negócios. O emprego para Njamba era apenas uma forma de não se distanciar da irmã e uma questão de estatuto social.

- Mulher que trabalha tem outra respeitabilidade no bairro e mesmo os cavalheiros que se atrevam a perder vergonha, na hora de desfilar a prosa, pensam duas a três vezes . - Dizia-se no bairro das Acácias onde residiam. Isso envaidecia as manas e outras jovens da urbanidade e fazia com que Njamba seguisse as pegadas de Ngeve que, por sua vez, coleccionava distinção atrás de distinção por causa do seu inconformismo com o status quo e a sua capacidade inventiva. Em termos de resultados práticos, Ngeve era das que mais produziam e estava sempre a inovar nos procedimentos, procurando poupar desperdício de tempo e material.

- O cérebro é a mais útil das ferramentas de trabalho do homem e não pode ser aposentado antes da morte. - Recitava incansavelmente Ngeve.

 Essa sua entrega e prontidão, que contagiava o resto da equipa e a liderança, faziam dela uma mascote. As suas ausências eram rapidamente percebidas até pela alta hierarquia da organização. Não pelo seu brilho corporal que, embora dotado de um arranjo escultural, tinha uma exposição situada na penumbra. Era pelo seu bem fazer e sempre com alegria no rosto, mesmo quando a tarefa fosse penosa.

Njamba era diferente. Mais vistosa e mais exposta à luz e aos megafones do que à actividade trabalhista. Se faltasse, ninguém na equipa dava por ela. Porém, quando fosse o inverso, se por uma razão bem ponderada Ngeve se ausentasse, Njamba era bombardeada com a pergunta "que se passou com a sua mana do sorriso aberto?" a quem disfarçadamente a liderança mostrava empatia e saudades.

- Mas nós somos gémeas verdadeiras e vocês apenas se lembram dela? - Reclamou certa vez meio aborrecida, depois de ter gozado férias sem que ninguém tivesse sentido a sua falta.

Pascoalina, uma idosa já reformada que havia sido recontratada para formar os novos agentes administrativos e contribuir para a  moralização e comprometimento dos funcionários públicos daquele Ministério, puxou da sua experiência e sabedoria para uma lição de vida que Njamba afirma jamais se esquecerá. E a anciã, nos seus sessenta e cinco anos, começou assim:

- Filha, beleza acaba. Olha pra mim e diz se encontras nesses retalhos um corpo de miss? Já fui, entretanto, miss distrito, miss província ultramarina e primeira dama do concurso metropolitano no tempo doutra senhora. A Única faixa de miss que não se desfez com o tempo foi o meu empenho e responsabilidade profissional. É isso que motivou a minha recontratação quando já estava a cuidar dos netinhos e dos reumatismos. Queres ser bem lembrada e valorizada, filha? Trabalha!  - Recomendou Pascoalina.

A anciã fez pausa para buscar outro exemplo e prosseguiu:

- Nos tempos em que tínhamos a vossa idade, trabalho de escritório era maioritariamente para homens, as mulheres eram poucas, pois éramos mais direccionadas para donas de casa. É isso que você anseia? É para isso que queimaste pestanas na faculdade? Olha, Njamba, o patrão apenas se lembra de quem faz falta. Um dia, e não falta muito, a Administração Pública será gerida como são geridas as empresas. Estará ficada para os resultados e não mais para as simples presenças físicas e desfiles de meninas de cintura fina. Aí é que se verá quem merecerá ficar e quem deverá ser mandado para casa cuidar da roupa e da loiça. - Explicou a instrutora.

Njamba acompanhava atenta a explanação de Pascoalina que pausava apenas para regar os pulmões com  ar puro.

Ngeve, a gémea de Njamba, também apelidada de génia, estava em missão de serviço no exterior do país.

Pedagógica, dona Pascoalina prosseguiu:

- Queres marcar teus colegas e teus chefes para toda a vida, filha? Trabalha! Inova. Pensa todos os dias em coisas novas ou em como simplificar as tarefas, tornando os procedimentos menos burocráticos e menos dispendiosos em termos de tempo e de custos.

Do simples abanar da cabeça, em gesto de aprovação de tudo quanto ouvia, Njamba passou à anotação na sua agenda.

- Obrigada, 'vó' pelos conselhos. Reconheço que não tenho estado ao nível da Ngeve e compreendo hoje por que perguntam por ela quando não vem e por que razão de mim quase ninguém se lembra quando falto.- Confirmou Njamba.

- Pois minha filha, rematou Dona Pascoalina, apenas os que fazem falta são lembrados. E não te esqueças que todos os patrões, quer sejam privados ou estatais, são da "mesma escola". Se se apercebem que você não faz diferença mandam-te para casa na primeira oportunidade ou necessidade que tiverem de reduzir pessoal. Pensa nisso, filha. O país tem rumo e os tempos são de mudança de comportamento e mais atitude! - Concluiu Pascoalina sempre pedagógica e com ar maternal.

A conversa já ia longa quando o director chamou a equipa para comunicar que da avaliação de desempenho em curso resultaria na dispensa e transferência para unidades periféricas de agentes e funcionários que ainda não tinham encarnado a nova filosofia de trabalho. Njamba foi para casa pensativa ao passo que Pascoalina continuou as suas preleções, desta vez com Weza, um jovem que apresentava dificuldades de integração em equipas compostas por diferentes grupos etários.
NOTA: texto publicado pelo Semanário Angolense de 02 de Setembro de 2015

quinta-feira, outubro 15, 2015

UM OLHAR ENGENHOSO E PRAGMÁTICO AO FUTURO

A crise económica e financeira que afecta as nossas instituições e famílias é hoje tema de conversa em todos os cafés e paragens de transportes colectivos. Apesar de estarmos quase todos inconformados, uns lutam para contorná-la ou mesmo revertê-la, ao passo que outros não passam dos lamentos.

A nossa atitude em relação à forma como encaramos os desafios que se nos são impostos determina os êxitos e ou OS fracassos na caminhada e desenham o nosso futuro.
Estabelecendo paralelismos entre a vida humana e o mundo animal, verificamos que o futuro de um herbívoro depende da existência de água, relva ou pasto e sagacidade em fugir dos predadores. O futuro dos carnívoros depende da sua perspicácia e coragem em atacar, até os animais mais corpulentos, e da resistência e persistência. Diria mesmo, resiliência. Assim também é o futuro das pessoas e das organizações que precisam de explorar as crises e os desafios, fazendo deles oportunidades, contornando com galhardia cada obstáculo que surja.

Como você encara os desafios que se lhe são impostos no seu dia a dia? Cruza os braços como o cordeiro cansado de fugir dos seus predadores e que se entrega à fome do lobo? Faz da presença do um perigo uma oportunidade para ensaiar a sua velocidade, destreza e resistência!
Pois, então imagine o que acontece com os corpulentos elefantes quando a sua manada se depara com a presença de um faminto e franzino leão. Imagine agora o tamanho, a força e o peso de um elefante, perante um leãozito franzino e faminto.
Apesar de toda a sua imponência, acontece que o elefante, encara a presença do leão como um perigo à sua integridade física e, em vez de enfrentar o intruso de forma frontal, vira de costas, acusa o complexo de inferioridade, acobarda-se e sai correndo em debandada.

- Ali está o rei. – Diria o elefante, se fosse um ser pensante e dialogante.

O leão, vendo os elefantes em retirada, acusa o complexo de superioridade e logo aponta uma oportunidade para saciar a sua fome.

- Comida! – Gritaria ele, se fosse racional.

É exactamente o que acontece na selva. A cobardia de uns, mesmo beneficiados em tamanho, redunda em oportunidade de saciar a fome para outros ainda que de menor compleição física. A crise para uns é oportunidade de melhoria para os sagazes, inovadores e resilientes.

E  como você encara então a falta de material de escritório, a falta de transporte de recolha, a perda do poder de compra dos salários, entre outras dificuldades derivadas da falta de dinheiro nas instituições e nas famílias?

Ao se deparar com os desafios que se colocam à frente de si, você diz que ali está uma oportunidade de melhoria? Busca soluções inovadoras, produtos e saídas alternativos para fazer o que sempre fez em tempos de fartura, ou usa a táctica do elefante que se põe em fuga, perante a presença de um filhote de leão, deixando desprotegidas as suas crias?
Como dizia um pregador duma igreja protestante em Angola, “nada está perdido, enquanto não nos comportarmos como o fugitivo elefante”. Não acantonemos a mais bela e mais rica ferramenta de que somos possuidores, o cérebro.

Quantas vezes você desistiu, por falta de um pouco mais de coragem ou desconhecimento, quando estava próximo de atingir a meta? Você vai repetir a dose? Pense, inove, resista até ao limite de suas forças. É consabido que a necessidade aguça a arte ou o engenho. Encontremos então, todos os dias, ideias novas e soluções inovadoras para a crise financeira e material que nos assola. Refinemos também os laços de solidariedade institucional e pessoal para que a nossa locomotiva caminhe sempre sobre os carris. De que nos adianta andarmos aparentemente cómodos no vagão de trás de um comboio se noutro vagão, que vai em frente, as rodas estiverem calcinadas? De repente, elas podem deixar de deslizar sobre os carris e afectar também a nossa viagem.
O homem é um ser gregário e solidário que necessita da associação, cooperação e interdependência com os seus semelhantes para realizar os seus intentos e da colecttividade em que estiver inserido. Se é inteligente nos unirmos em momentos de fartura, tal deve  ser mais ainda nos tempos de carência. Busquemos, então, aliviar as dificuldades e os sofrimentos dos outros que menos têm com aquilo que sobra do suprimento de nossas necessidades e que podemos dispensar ou ceder.

Já imaginou quantos vivem de descartados ou mesmo em descartados? Já pensou que os seus descartados podem ser materiais úteis e utensílios de grande valia para aqueles que pouco ou quase nada têm? O melhor ensino é o exemplo (Nelson Mandela). Demonstre isso em casa, no serviço e onde quer que esteja e verá que os beneficiários das suas acções solidárias exibirão um outro sorriso mais luminoso. Ficar-lhe-ão imensamente gratos e você seguirá em frente com a alma mais reconfortada.

Tal como as carruagens de um comboio que fazem parte de uma mesma composição locomotiva, assim são também os nossos órgão institucionais que são partes de um mesmo Departamento ou Organização que deve funcionar de forma integrada e harmoniosa e com a mesma velocidade entre os seus componentes. As distintas áreas de uma organização estão tão interligadas que se parecem às engrenagens de um relógio. Bastará que um dos carretos de uma engrenagem se quebre para que o relógio deixe de marcar as hortas certas.
Já pensou no que vai fazer hoje, de diferente, para que a sua jornada laboral não sofra quebra?
Erga o rosto e diga aos desafios que atravessarem o seu caminho que eles serão como o elefante fugitivo: comida para o leão faminto. São uma oportunidade para a melhoria contínua dos seus processos.
Obs: Texto Publicado no Semanário Angolense a 30.10.2015

quinta-feira, outubro 08, 2015

PERSPECTIVAS INTERCULTURAIS

“Soberano Canhanga” como é conhecido pelo seu pseudônimo, nasceu em Libolo, em 1976. Reside em Luanda, a capital de Angola, e teve passagem de nove anos pelo nordeste do país. É formado em Comunicação Social e Pedagogia de História

Por Gilvaldo Quinzeiro
Estamos iniciando em “Perspectivas Interculturais”, como o próprio nome sugere, um diálogo com as diferentes culturas, estilos artísticos e gênero literário. Nesta edição queremos que o público caxiense, maranhense e brasileiro conheça o jornalista, cronista e poeta angolano Luciano Canhanga.
 “Soberano Canhanga” como é conhecido pelo seu pseudônimo, nasceu em Libolo, em 1976. Reside em Luanda, a capital de Angola, e teve passagem de nove anos pelo nordeste do país. É formado em Comunicação Social e Pedagogia de História. Frequenta mestrado em Ciências Empresariais pela Universidade Fernando Pessoa, depois de frequentado o MBA em Gestão de Pessoas pela FAAG-Brasil. Luciano Canhanga é atualmente Gestor de RH no Ministério de Geologia e Minas. O que pensa este angolano sobre o Brasil? O que fala da cultura angolana? Quais são suas obras literárias? Leia a entrevista!
Gilvaldo Quinzeiro – Senhor Luciano Canhanga, muito prazer! Bem-vindo a Perspectivas Interculturais! Obrigado por nos conceder esta entrevista! Fale-nos da sua inserção cultural ai em Angola? Qual a sua produção cultural? Quantas e quais obras literárias publicadas?
Luciano Canhanga - Vivo a cultura angolana que sendo única não se dissocia da cultura e civilização universal. Como amante das letras, tenho cinco livros publicados entre 2010-2015, assinando com o pseudônimo Soberano Canhanga.
O sonho de Kauia, romance de estreia, em 2010; Manongo’Nongo, contos, 2012; 10 encantos, poesia, 2013; O relógio do Velho Trinta, romance, 2014 e O coleccionador de pirilampos, contos, 2014.  Também sou bloguista desde 2005, escrevendo sobre aspectos antropológicos, sociais, históricos, comunicacionais, entre outros nos meus seis blogues, sendo o principal www.mesumajikuka.blogspot.com
Gilvaldo Quinzeiro – Qual o seu estilo literário? Que traços da cultura angolana está presente em seu trabalho?
Luciano Canhanga -  Identifico-me mais com a prosa, sendo a crônica o género em que melhor exercito. Isso se deve à minha condição de jornalista há já vinte anos. Costumo mesmo dizer que não sou escritor. Apenas um contador de cenas, descrevendo a sociedade através da crônica ou da versificação. A minha escrita é vivencial embora pintada e repintada com o lado artístico.
Gilvaldo Quinzeiro – O Senhor além de ser colaborador da HLC, está lançando um livro bilíngue pela Editora Pim, da série Biblioteca Universal. Fale desse livro? O que é para o Senhor fazer parte desse projeto?
Luciano Canhanga - Conheci o Dragomirescu Daniel, editor do HLC, nas lides sociais, há já cinco anos depois de publicar o meu primeiro livro. É uma boa experiência partilhar com o mundo o fruto do nosso trabalho intelectual. Os angolanos são ainda pouco traduzidos e levar os meus textos à Europa e América é motivo de satisfação. Canções ao vento são poemas que retratam Angola nos seus mais variados contextos econômico, político e social. É obvio que não são crónicas versificadas, devendo exigir sempre uma segunda leitura, dada a polissemia do texto poético. Porém, quem ler as minhas canções, encontrará nelas, com certeza, um país que atende por Angola e um povo com dinâmica própria de vida. 
Gilvaldo Quinzeiro -  E com relação a literatura Angolana, o que o Senhor tem a nos dizer? Quais os autores mais lidos? Como é o público leitor angolano?
Luciano Canhanga - Os angolanos já começam a ler muito mais e temos leitores heterogéneos. Hoje não se leem apenas os nacionais, mas também os autores estrangeiros e, particularmente, brasileiros. As ferramentas digitais levam-nos a todos os recantos. Quanto aos nacionais, são incontornáveis nomes como Pepetela, Manuel Rui, Uanhenga Xitu, Alda Lara, Jofre Rocha, Roderick Nehone, Ismael Mateus, Luis Fernando, Lopito Feijó, Ondjaki, Cremilda de Lima, Maria Celestina Fernande, José Eduardo Águalusa, etc. Vai também surgindo um grupo de escritores da nova geração, como o Gociante Patissa, António Quino, Ras Nguimba Ngola, David Kapelenguela, e outros bastante promissores, segundo a crítica.
Gilvaldo Quinzeiro – Como o Senhor ver a relação Brasil/Angola?  O que precisa melhorar nesta relação? Como o angolano ver o Brasil? Que autores brasileiros são lidos pelos angolanos?
Luciano Canhanga - Os novelistas e romancistas brasileiros como Jorge Amado são dos mais queridos em Angola. As telenovelas brasileiras são muito consumidas em Angola e a Tv acaba por nos levar ao texto que dá suporte às telenovelas. Isso faz com que se conheçam mais os actores e autores. Porém a falta de estudos e publicações regulares faz com que a minha apreciação seja apenas minha, sem exteriorizações. As relações históricas, políticas e económicas entre Angola e Brasil são das melhores que existem. Do ponto de vista cultural, assisto a um movimento unidirecional: vejo o Brasil mais na condição de produtor e exportador, sendo Angola mais consumidor de produtos culturais brasileiros. É aqui que as partes, sobretudo a angolana, precisa de trabalhar mais. Do outro lado há um grande mercado e uma ânsia por conhecimento de África que pode ser produzido e fornecido pela costa este do Atlântico. Precisam ser afinados os mecanismos de comunicação e intercambio para que a África vá mais à América, culturalmente falando.  Não basta dizer que o Samba é filho do Semba (de Angola) ou que a capoeira foi levada por africanos. É necessário que haja um intercâmbio e conhecimentos permanentes.
Gilvaldo Quinzeiro – Como os autores angolanos estão utilizando as mídias atuais? No que a internet, as redes sociais têm contribuído na produção dos novos autores angolanos, e na sua em particular? 
Luciano Canhanga - Os jovens, sobretudo, têm aproveitado as novas tendências da mídia para se mostrarem ao mundo. É o meu caso. Tenho três ebooks que me levam a um universo maior de leitores, aonde o livro físico não chegaria. Acredito que essa tendência venha a crescer cada vez mais e a quebrar barreiras e fronteiras. Há também uma crescente utilização de redes sociais o que, por si só, pluraliza a sociedade e torna a sociedade mais aberta ao mundo. 
Gilvaldo Quinzeiro – Faça as suas considerações finais.
Luciano Canhanga - Sinto-me grato por ter merecido a vossa atenção e pela oportunidade que me concedem em exteriorizar algumas ideias. Espero que continuem nessa senda e que deem oportunidades a mais literatos angolanos para levarem ao mundo o que lhes vai na alma.
Obrigado.

quinta-feira, outubro 01, 2015

CAMINHOS EVITÁVEIS

Na áurea das independências, e influenciados pelos ventos revolucionários e ideologia dos países do Leste europeu, dois Estados da conhecida Região do Corno de África decidiram fundir as suas fronteiras num acto que visava aproximar os dois povos que comungavam de culturas e valore muito parecidos.

Essa visão política estendeu-se ao fórum empresarial e económico. Algumas firmas do pais Ericeira estabeleceram parcerias, face a existência de novas oportunidades de mercado e possibilidades de expansão de negócios.

Tonka Incorporated, uma firma que dominava o segmento da prestação de serviços de higiene e segurança em instituições públicas, bem como a gestão e e aplicação de políticas de Recursos Humanos, tinha uma considerável quota de mercado em Ericeira e um excesso de liquidez que permitia a empresa explorar a oportunidade criada pela conjuntura exógena, a fusão dos territórios entre Ericeira e Entropia.

Em viagem de serviço a capital de Entropia, que se tornou a segunda cidade mais importante do Estado Unificado, Sir Kato Ndombele, o patrão da firma KatOn Service Incorporated, conheceu Hamed Tonka, o Presidente do Conselho de Administraçao da firma Tonka Incorporated, e com ele decidiu estabelecer uma parceria, criando uma fusão entre as duas empresas, tempos depois, antecedida de aturadas negociações.

A KatOn era uma empresa com reputação ao nível do continente africano e de alguns países do sul da Europa em termos de gestão de Capital Humano e prestação de serviços. Porém, as transformações políticas no país e as nacionalizaçoes ocorridas em Ericeira não facilitaram uma expansão dos seus negócios, muito menos criar uma almofada financeira que permitisse atacar o novo mercado que surgiu com a fusão dos dois Estados vizinhos. Os quadros da KatOn tinham porém a fama de terem trabalhado em grandes multinacionais, gozando, por isso, de grande reputação junto de outros parceiros empresariais e organizações governamentais.

A Tonka, empresa da Entropia, viu nela uma parceira capaz de agregar valor aos seus recursos financeiros excedentários.

Fundidas as empresas Tonka e KatOn, a nova entidade jurídica passou a designar-se Toka International, sendo grande parte da sua gerência confiada aos executivos procedentes da KatOn, que era minúscula em termos de estrutura, mas robusta em termos de know how e qualidade do seu Capital Humano. A sede da nova entidade empresarial, a operar no território unificado, passou a ser a antiga Base Central da então Tonka Incorporated, o que levou os funcionários mais antigos da Tonka a tratarem os seus novos colegas com os mais variados epítetos depreciativos. Eram tratados como "estrangeiros, invasores, usurpadores de cargos, etc.",  situações que a juventude bem disposta, comprometida e motivada, procedente da KatOn, geria com inteligência e postura institucional.

- O nosso lema é trabalhar, fazer a nova empresa crescer e crescer com ela. - Diziam os jovens executivos saídos da KatOn.

De simples alegações ciumentas, passou-se a confrontos verbais mais acirrados que chegavam, em muito dos casos, a inviabilizar alguns planos de crescimento da Toka International.

Como as lideranças estavam mais focadas na consolidação da fusão e desenvolvimento da nova estratégia de negócios propiciada pelas razões endógenas (excesso de liquidez e domínio de consideravel quota de mercado por parte de Tonka e elevada preparação técnica dos quadros da KatOn) e pelas razões exógenas (fusão dos dois países, crescimento económico e restruturação das instituições públicas), preferiram tocar o negócio para a frente, buscando apenas a participação daqueles que estavam interessados em trabalhar, fossem quais fossem as suas funções hierárquicas nas equipas. As lideranças intermédias rapidamente interpretaram o pensamento estratégico e começaram a trabalhar com os quadros disponíveis, ficando sem trabalho aqueles que, a todo o custo, puxavam a carroça para trás ou usavam a táctica do caranguejo (não permitir que alguém trabalhe ou colabore). O curso dos acontecimentos levou a que os quadros da Tonka que aderiram à nova filosofia de trabalho aprendessem com os outros provenientes da KatOn e se especializassem em distintos ramos do saber. Às cegas ficaram aqueles que desistiram de trabalhar, procurando apenas conspirar contra as novas lideranças da Empresa Unificada e os colegas que tinham aderido à nova fislosofia de trabalho.

Vinte anos depois, o Leste europeu conheceu outros desenvolvimentos políticos, com maior realce para a queda do Muro de Berlim, que levaram à desintegração de Estados em alguns continentes desanexações de territórios, efeitos que se estenderam a países que orbitavam na esfera ideológica do Leste europeu. Isso fez com que a integridade do Estado Unificado de Ericeira-Entropia fosse afectada, repercutindo-se também em alguns negócios empresariais, sobretudo os actores que trabalhavam com instituições públicas.

Da Toka International ressurgiram duas novas entidades empresariais que passaram a actuar com a mesma tecnologia e conhecimento nos países (re)emancipados.

- Chegou a nossa hora de governar o país e a empresa, terminada que está a ocupação ilegal dos nossos postos de trabalho e de chefia. - Proclamou a velha guarda resistente da antiga Tonka de Ericeira.

Os jovens competentes, formados no tempo da fusão, foram relegados para planos secundários na organização, sendo catalogados como "produto da colonização empresarial", ocupando a velha guarda os postos de decisão na empresa.

Aqueles que, sendo da mesma geração que a velha guarda tonkanense, tinham aderido às novas formas de trabalho, no tempo da gigante Kato International do Estado Unificado, também foram ostracizados sob a alegação de "se terem juntado ao colonizador".

- Quem se juntou ao opressor que invadiu a nossa empresa e tomou os nossos lugares, agora que nos livramos deles, deve partir ou sujeitar-se à nova ordem. – Apregoavam eufóricos.

O poder de transformar a empresa e seguir o seu percurso de crescimento e expansão tinha-lhes sido entregue. Porém, os vinte anos de defeso, sem trabalho e contacto com as novas ideias e novas tecnologias, fez deles maus líderes e maus obreiros. De uma imponente empresa que foi antes e depois da fusão, a Tonka não passa hoje de um impotente manto de retalhos, com tecnologia e capital humano a reclamarem por uma reforma profunda.

Do outro lado, em Entropia, segue de vento em popa a KatOn International que absorveu da sua antiga parceira o conhecimento de mercado, capitalizou os investimentos herdados com a fusão e conta com os seus quadros cada vez mais qualificados.

Quando se realizam fusões de organizações empresariais, independentemente da procedência, quantidade de quadros indicados para a gestão e do peso que tenham ou venham a ter na organização, é importante que cada uma das partes fundidas ou componentes das partes dêm o seu máximo para a consolidação da nova entidade. Todos os integrantes devem absorver as vantagens da fusão e da interação com os outros actores (que se juntam à nova organização).

Ficar na sombra, a reclamar o declínio dos gestores no activo, pode ser perigoso para quem arme este estratagema como forma de reivindicar o poder, pois, uma vez no exercício do poder reclamado, pode ver-se despido de ferramentas para a exercitação das funções que lhe foram confiadas. Ficar na sombra, a torcer pelo descarrilamento do comboio, para depois tomar o lugar do maquinista azarento, poder ser uma estratégia perigosa como se verificou entre os integrantes da firma Tonka de Ericeira que deitaram a baixo até o que de mais valioso tinham conseguido com muito labor: o supervait e considerável quota de mercado ericeiriense no domínio da prestação de serviços de higiene e segurança em instituições públicas, bem como a gestão e e aplicação de políticas de Recursos Humanos.

Nota: a presente reflexão é produto de criatividade aliada ao estudo de casos científicos no curso de MBA realizado na FAAG, não se dirigindo a pessoas e ou instituições concretas de nenhum Estado ou território.
 
Obs: Texto publicado no Semanário Angolense de 06.11.2015.