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quinta-feira, março 28, 2024

UM NOVO EX-LIBRIS EM MAPUTO

Maputo's bridge, ofcourse! 
A Ponte que liga as duas margens da Baia é hoje um ex-libris de Maputo, enlevo que o visitante que chega à capital moçambicana pode contemplar à janela de um avião, convidando-o a percorrê-la em terra e desfrutar da sua beleza e robustez. Aconteceu comigo.

_Que bela criação humana! _ Disse para mim mesmo, fazendo-a, imediatamente, constar dos pontos a visitar nas 48 horas em Moçambique, o que aconteceu no segundo dia da minha estada por terras de Machel.

Solícito, o jornalista Ouri Pota e sua "turma": Maló (o dono do carro), Américo (o mais velho e proprietário da taberna onde se afinam as conversas e se afogam as mágoas) e o Manhiça (pintor de pena refinada e dono de uma lábia humorada que escorre como o Rio Maputo) entenderam organizar um almoço (domingo 03.03.24) na Margem Sul da cidade, onde o Pota faz a sua casa para o pós-cinquenta envolta a uma floresta por ele plantada. Pedido feito, pedido atendido: ver a ponte de perto.

Percorremo-la de carro, depois de cuidarmos da logística que consistiu em "comícios e bebícios". O embarcadouro, que vai sucumbindo aos poucos, depois da construção da Ponte, foi a primeira paragem. 

_ Já foi um local muito movimentado que acolhia muita farra e festas. _ Explicou o Manhiça.

Há barracas que resistem ao tempo e algumas pequenas embarcações (de recreio) que ainda fazem a travessia da baía levando este ou buscando aquele. Senhoras de todas idades estão envolvidas na venda de peixe grelhado, à semelhança da nossa Ilha de Luanda e os cantineiros não perdem a oportunidade para o comércio de retalho. As viaturas que atravessavam por cima de jangadas fazem hoje uma travessia segura e prazerosa, pagando uma portagem que varia em função da categoria do veículo (

semi-colectivo MT 30,00; autocarro MT 60,00; classe1 MT 125,00; classe 2 MT 250,00 MT etc.).

A ponte Maputo–Katembe liga os distritos de Nlhamankulu (margem norte) e Katembe (margem sul), em Maputo. É hoje a maior ponte suspensa de Africa, remetendo para a segunda posição a ponte de Matadi (RDC).

As obras decorreram entre 2014 e 2018, tendo sido inaugurada no dia 25 de Junho (data da independência) e aberta à circulação a 10 de Novembro, coincidindo com os 131 anos da fundação de Maputo (antiga cidade Lourenço Marques).

A parte suspensa da ponte possui 4 faixas de rodagem (duas em cada sentido), 680 metros de comprimento e atravessa a Baía de Maputo a uma altura de 60 metros. 

O viaduto norte mede 1097 metros de comprimento e está ligado à rotunda da Praça 16 de Junho (com acesso às estradas nacionais EN2 e EN4) no bairro da Malanga, em Maputo. O viaduto sul mede 1234 metros de comprimento e é composto por elementos pré-fabricados até 45 m de comprimento, conectando-se à estrada para a Ponta do Ouro.

O vão entre os dois pilares é de 680 metros, o maior de África. Os principais cabos de suporte estão ligados através de cabos de aço no Norte e no Sul, cada uma com um bloco de ancoragem maciço. As cargas extremamente elevadas da estrutura demandaram fundações de estacas com diâmetros de 1,50 m a 2,20 m, que atingem 110 m de profundidade no subsolo marinho (lama). Os dois pilares têm 141 m de altura e a uma altura de cerca de 40 m existe uma viga transversal para a faixa de rodagem. As peças individuais pré-fabricadas de aço para a faixa de rodagem têm cada uma 25,60 m de largura e 12 m de comprimento.

Construída por uma empresa chinesa e financiada igualmente por um banco daquele país a Ponte Maputo-Katembe é prova de que com coragem e determinação é possível erguer obras tecnicamente desafiadoras, esteticamente lindas e com utilidade sócio-económica. É também um apelo aos presentes e futuros que, no caso de Angola, já clamam por passos semelhantes. A Ponte de Matadi, sobre o Rio Zaire, em território congolês, pede uma "irmã" mais a Oeste que nos permita chegar cedo a Cabinda (embora do outro lado haja uma língua de terra que pertence à RDC, a sul de Cabinda). Por outro lado, temos o Mussulo e o pagamento de portagens, como já acontece na circulação sobre a Ponte sobre o Rio Kwanza, a sul de Luanda, pode amenizar o retorno dos investimentos.

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Publicado pelo Jor. Angola de 14.04.2024


sexta-feira, março 22, 2024

THE DOG AND HIS OWNER

A noite era de poucas estrelas e um vento bom, quente e apalpador, que vinha empurrado da Baia de Maputo. O meu anfitrião e cicerone Ouri Pota Chapata Pacamutondo entendeu levar-me a uma espécie de "sindicato dos artistas". 

O bairro fica próximo do aeroporto e é já fora do caso urbano com casas de autoconstrução e algumas preocupações no saneamento. A casa indicada é a do saxofonista Américo   Macutamo "Mile Davis" que tem uma taberna muito frequentada pelos artistas e divulgadores de arte.

O Pota, para além de repórter de rádio (agora passou à gestão) é um apaixonado pela fotografia que tem um condão artístico. Levou-me ao local e lá conheci o anfitrião Américo, o artista plástico Vasco Manhiça, o Malote Mathe e o seu irmão, e outros que foram aparecendo e saindo, seguindo a passada das garrafas de cerveja que eram entregues encapsuladas e voltavam vazias, revezando-se umas com as outras.

As conversas, sem sumário rígido, variavam entre sociedade e artes. Afinal, tinham recebido um jornalista-escritor-cronista que visitava Maputo pela primeira vez, que estava sedento de recolher o máximo de informação possível sobre esta terra lusófona no Índico. Os moçambicanos, por sua vez, curiosos, procuravam igualmente indagar isso e aquilo. Mostravam, na verdade, ser bons question-makers sobre a Angola do pós-independência e pós-guerra civil que enterrámos em 2002.

Quando lhes falei sobre o encanto que era a Ponte Maputo-Katembe, a curiosidade deles virou-se, obviamente, ao que nós Angola tínhamos construído de relevante no pós-independência, fazendo-me desfilar um rio de anotações mentais de tudo quanto meus olhos registaram e a minha mente gravou.

_ Sou do Libolo, interior de Angola, de onde saí aos dez anos. Conto já 40 anos em Luanda e conheço todas as capitais das 18 províncias. Dou-vos dois exemplos: Luanda que encontrei em 1984 tinha o BPA e o Hotel Presidente como os mais altos prédios. No outro lado da Baia, que chamamos Ilha, é o Panorama quem brilhava e diziam ter 5 estrelas. Hoje quem espreita a cidade baixa encontra um conglomerado de arranha-céus. Muitas ruas que conectavam a parte urbana à suburbana em crescimento exponencial eram estreitas, tendo sido alargadas e melhoradas. Construíram-se nós rodoviários para facilitar a circulação automóvel, cujo parque teve uma ascensão de 8 para 80. Enfim, são muitas coisas que, quando nos recolhemos à retrospectiva nos levam a essa conclusão. Outro exemplo são as cidades construídas de raiz, por quase todo o país, para amenizar a carência de habitação. Foi um passo bom, mas temos mais. O meu bom exemplo tem sido a cidade de Ondjiva que foi toda despedaçada pela aviação sul-africana ao tempo do apartheid. Hoje o que se encontra é um "fénix renascido dos escombros". _ Contei-lhes, entre pausas, para atender os pontos-d 'ordem e amenizar a garganta com líquido dourado.

Os bons apreciadores da "espuma" já iam em boas doses (eu disse doses e não doze) quando, embalado, o Manhiça lançou a sua proposta irrecusável.

_ Epá, ó mano escritor angolano, assim mesmo estamos a selar a nossa amizade. A esta hora já não nos dá jeito para irmos à minha casa e voltares ao hotel, mas amanhã o "meu filho" Pota levar-te-á ao meu atelier para teres uma recordação.

Agradeci de imediato a amabilidade e sonhei envolto a obras pictóricas. Afinal, ao que o Pota e outros companheiros contaram, o Manhiça, moçambicano de 45 anos que decidiu "pintar o seu país", depois de largos anos na Alemanha, é um dos mais proeminentes "seguidores" de Malangatana.

Domingo, dia D, comparecemos à hora nove. "Encontrámo-lo" não estava. O filho explicou que o avisara para que não saísse sem telefone. "Mas o tio Pota já conhece a teimosia do seu amigo. Disse que não demoraria, só que se aparece alguém a dar-lhe conversa ele se esquece de outros compromissos".

Aguardamos até à hora do esvaziar da paciência. Diligente, porém, o filho de Manhiça (grandes conversador) tinha feito ligações a alguns amigos do pai para que quem o visse o alertasse da chegada do visitante angolano. Não tardou chegou animado com o seu cigarro fumegante, convidando-nos a adentrar o seu atelier.

"The dog and his owner" (o cão e o seu dono) era um conjunto de quatro peças que ficaram repartidas. Duas estão agora em Angola e outras duas permanecem em Moçambique, ainda sem novo dono.

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Publicado no Jornal Cultura de 12.03.24

quinta-feira, março 14, 2024

VISITA GUIADA À RÁDIO MOÇAMBIQUE

Em companhia do Ouri Pota Chapata Pacamutondo, Director do Centro de Formação da Rádio Moçambique, visitei, a 04.03 24, a RM. 
Como quem quer conhecer a rádio em toda a sua dimensão, comecei pelo que chamam de "fitoteca", arquivo áudio das primeiras emissões de Rádio em Moçambique [1933], discursos e outros registos relevantes. Inicialmente, os registos eram feitos em Vinil, depois em bobines, mais tarde em cassetes, disquetes, minidisco, CD, etc.

_ Chamamos essa área de "fitoteca" (fica no rés-de chão do edifício de seis andares) por causa das fitas aqui conservadas (bobines e cassetes) _ Começou por explicar o cicerone Ouri Pota.

Hoje, os registos são feitos em Hard Disc. O desafio de todos os tempos tem sido a conversão de áudios de um suporte em desuso para o outro emergente e a inoperância de alguns equipamentos de leitura. 

_ É um trabalho que não para, pois tem de se acompanhar a evolução tecnológica. _ Disse-nos Laurentino da Silva, o responsável pela "audioteca", também ele considerado "uma biblioteca da fitoteca" da Rádio Moçambique, dado o conhecimento acumulado sobre a área e a rapidez com que é capaz de localizar um registo sonoro histórico.

Como que a buscar a consonância entre as explicações que dava e a demonstração prática em como se localizam "as fitas" mais antigas, provoquei-o a localizar a cassete com o discurso proferido pelo Presidente Samora Machel quando, a 25 de Junho de 1975, proclamou a independência de Moçambique. Laurentino, que interrompera o seu café à nossa chegada desavisada, fê-lo num abrir e fechar de olhos como se tivesse um detector de cassetes entre os dedos.

Depois, visitei a discoteca que conserva músicas de todas as idades (desde os anos 30 do séc. XX aos dias que correm), nos mais distintos suportes, tal como a audioteca/fitoteca. A discoteca da RM está em rede, permitindo o acesso rápido por parte dos realizadores de programas e locutores. 

_ Já não precisam de fazer requisições prévias como antes, acontecendo apenas em casos de músicas que não estejam na rede. Quando recebemos uma requisição, fazemos uma transcrição imediata e colocamos a música ao dispor da Rádio. _ Explicou Porfírio Mathe.

Muitas músicas antigas foram convertidas em suporte digital e outras estão ainda por converter. Em ambos os casos, "é uma luta contínua", asseverou Porfírio, um dos técnicos da Discoteca que teve a amabilidade de fazer as honras da casa.

A rádio, porém, e todo o seu edifício tecnológico, não são apenas pessoas, voz, sons e silêncios. A componente técnica para que o som produzido seja emitido em ondas hertzianas e captado pelos recetores, há uma sala chamada de Central Técnica. Na Rádio Moçambique, é responsável pela recepção e emissão dos 4 canais produzidos em Maputo-Cidade (Antena Nacional, Antena Internacional, Rádio Cidade e Rádio Desporto), assim como pela recepção e retransmissão do sinal das dez emissoras provinciais (Cabo Delgado, Gaza, Inhambane, Manica, Maputo-província, Nampula, Niassa, Sofala, Tete e Zambézia) ao que se adiciona o sinal da Emissora Provincial de Maputo (há distinção entre Maputo Cidade Capital de Moçambique e Maputo Província).

_ Aqui é o coração da Rádio. _ Ouvi do responsável da CT, _ acrescentando que é lá que se confirmava a concretização da comunicação radiofónica.

Seguimos à Radio Cidade, congénere da Rádio Luanda, onde o meu anfitrião Ouri Pota fez carreira até passar à gestão. 
Encontrámos o jovem Hélder Mendes, animador de cabine por excelência e que tem uma grande audiência. A cabine é "auto-operada" e o locutor conversa com os radio-ouvintes sem a intervenção do técnico de som/sonorizador.

_ É uma forma de conferir melhor à vontade ao locutor e o patrão poupar dinheiro com menos pessoas, explicou, enquanto pousávamos para a foto. 

A Antena Nacional (congénere de Canal A da RNA) e a Rádio Desportiva (homóloga da Radio 5, com que "há um grande intercâmbio", no dizer dos moçambicanos) seriam os pontos seguintes.

Já na Rádio Desporto, depois de visitar os estúdios, fui convidado para "dois dedos de conversa" com a simpática jornalista Natércia Tomás, cuja voz, doce e melódica, muito se difere do comum sotaque moçambicano. A jovem parecia uma "tuguesa" pintada de negro com um sorriso escaldante a fazer parelha ao humor com que cativa os ouvintes e amantes da narração desportiva.

No final, Natércia pediu que sugerisse uma música para ser tocada como "oferta" do visitante angolano aos que nos ouviam naquele momento, perto de 10 horas da manhã de segunda-feira, 04.03.24. Apanhado por um "remate à queima-roupa" a minha escolha recaiu, exactamente, à queta "A luta continua" (para vencer o subdesenvolvimento) de Mirian Makeba.

Lá e cá "a luta continua"!

Terminámos a visita no Centro de Formação da Rádio Moçambique que, para além de atender às necessidades de formação/superação interna dos quadros, está também vocacionado a atender demandas externas como mestres de cerimónia, apresentação de discursos, jornalismo digital entre outros. Saimon Kabwé era o jornalista, descrito como um dos melhores noticiaristas da Rádio Moçambique e partilhava a sua experiência com meia dúzia de jovens candidatos a jornalistas com que tivemos a oportunidade de tocar algumas palavras.

_ Tal como em Angola, o jornalismo é uma profissão séria, de extrema importância social, insubstituível e que confere reputação. Embora não permita ao executante ser tornar-se rico no exercício simplesmente do jornalismo, confere ao profissional sério e comprometido uma grande reputação e abertura para outros voos. É incompatível com a trocas de favores e "mola" debaixo do tapete. _ Partilhei no minuto (de fama) que me foi concedido.
Conheço alguma rádio angolana melhor do que a nacional moçambicana? 
- A resposta é óbvia. Só a minúscula LAC onde "militei" de Dezembro de 1996 a Março de 2006.

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Publicado no Jornal de Angola de 31.03.24

sexta-feira, março 08, 2024

FUBADA MEMORÁVEL

Na banda não faltam motivos para organizar uma fubada como as que acontecem nos aposentos do ancião Salas Neto, no Distrito do Rangel, apimentadas de crónicas e outras chaladices, ou no apartamento kilambístico do  kota Lauriano Tchoia, acondutadas de suculentas codornas.

Na estranja, o esforço para encontrar uma bilada é maior. As opções sempre exíguas, vão para a papa dura (feita de farinha grossa de milho) oferecida pelo Marcos African Food ou é ao puré de batata que nunca se aproximam ao nosso pirão ou funji de bombó, podendo ainda variar para o misto, sempre a condimentados com largas postas de peixe do Atlântico Equatorial fartas verduras nascidas e crescidas ao sol resoluto.

Uma boa fubada, apomadada com castas do Bero ou Xixila, dá azo a prolongadas tertúlias e vozes que se elevam com o tempo de duração do repasto. 

Aqui (na estranja), no silêncio e pacificidade de Sea Point, (satélite de Cape Town) apenas os beggars (tidos como "malucos"), os carros, as motos noctívagas, os ventos e a fome falam alto. Vezeira, a fome vem de tempo em tempo, carregando, quase sempre a vontade de embrulhar uma boa fubada para contornar os sweet food destas terras.

_ Atenção! António, Lau, Adelino, preparem-se, estou a chegar. Amanhã quero-vos no meu apartamento e vamos fazer uma bilada! _ Anunciei, antes mesmo de saber se encontraria utensílios. 

Não houve resistência, afinal, a chegada de mais um mwangolê seria motivo para pôr conversas em dia, reflectindo sobre e vida de cá e as malambas de lá.

_ É só avisares a hora e as incumbências que lá estarei. _ Responderam um a um.

Dia D. A fome madrugadora, talvez incentivada pela combina da bilada, gritava mais alto do que os negros beggers que se achavam lyambados nas ruas "brancas" de Sea Point. 

O low shielding seria entre o meio-dia e as duas da tarde. Apressámo-nos nos preparativos. Melhor, o Lau cuidou de confeccionar o kalulu que o Star jura de pés juntos ter sido "inventado em Kalulu", assim como "o bolo vem do Lubolu". O Adelino cuidou das pomadas e o Oldest António ficou a moderar os excessos vocais, quando a pomada começou a fazer efeito.

Assim foi a primeira bilada. Uma fubada mista que só não recebeu estrondosas palmas de gratidão dos estômagos por estes terem a natureza de pedintes insaciáveis.

No fim-de-semana seguinte, foi a vez do Lau organizar a fubada.

_ Kotas, desta vez o conduto serão carnes assadas e, como temos assador no quintal, será lá nos meus aposentos. Preparem só as pomadas. _ Recomendou, fazendo-nos aparecer religiosamente ao meio-dia.

_ Haverá duas sem três?

O Adelino assumiria a terceira semana consecutiva. Desta vez, o Star prometeu levar sardinhas tugas para o início de conversa. Uma caixa de castas nacionais foi "raptada" pelo caminho e abatida com sucesso, dando cor ao frango e kabwenya tuguesa, levando a conversas que se prolongariam até à última gota, o último espinho e à derradeira ossada.

Mas, que tal se a fome e a vontade de embrulhar uma funjada chegam num dia de semana em que não dá jeito para reunir a equipa?

A solução é bikular a solo. Afinal, em casa ou na estranja, com amigos ou alone, ĥá sempre um motivo para uma fubada. Se bem regada, melhor!

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Publicado pelo Jornal de Angola de 21.04.24

sexta-feira, março 01, 2024

"FILHOS" QUE LADRAM

A forma como os governos dos países olham para as necessidades populacionais influência o comportamento generalizado da sociedade. Nisso, para a formatação de uma visão e consciência colectivas da sociedade, os meios de difusão massiva (MDM) e, nos tempos que correm, os multimedia exercem um papel fundamental.

Saídos da devastadora II Guerra Mundial (1939-45), que deixou um rasto de milhares de mortos e inválidos, os Estados vencedores e perdedores da Guerra, assim como suas colónias investiram milhares de dólares na comunicação de massa, incutindo nos jovens a beleza do convívio familiar (um pai, uma mãe e filhos). Tal resultou, obviamente, no reforço da sacralização do casamento e da família, tendo como consequência o "baby boom" dos anos cinquenta e sucedâneos.

Veio, a seguir, a produção virada para o consumo intensivo, o mercantilismo, o despesismo, o bem-estar e outras comodidades indispensáveis deste tempo. As televisões abraçaram a ideia basilar que lhes foi "vendida" e distribuíram-na aos jovens que vêem o casamento e a família como empecilho ao carreirismo, ao bem-estar material e ao lazer.

Caminhando pela marginal de Sea Point (Cape Town), observo, algo intrigado, a presença de muitos cães (perde-se no número, raças e tamanhos dos canídeos exibidos) a fazer companhia a singulares e aos poucos casais que se apresentam no "calçadão" que percorre a marginal. O que menos se vêem são as amáveis e doces crianças pronunciando os nomes de seus progenitores e ou de seus "frateres".

Ao saber que muitos deles são turistas que viajaram de seus países com tais animais de estimação, transportados sob cuidados muito especiais e em situações muitas vezes delicadas, sendo muito mais complexos de cuidar do que um filho, uma intrigante pergunta me persegue: mais vale a essas damas e cavalheiros um "filho" que ladra ou um nenê que chora quando calha?

Seguir o exemplo dos idosos que caminham de mãos dadas seria o mais expectável, mesmo quando estes se fazem acompanhar de um cachorro que vai no lugar do neto que lhes foi negado pelo(s) filho(s). Um dia, a carreira terá fim. As pessoas trabalham de forma intensa, abnegada e chega a reforma. Os cães têm vida curta e cada cão é mesmo um cão. Há de haver com quem conversar, trocar experiências e desfrutar juntos à mesa de um restaurante ou viajar coladinhos nos assentos de um avião. Com certeza que não será um "bobi".

Cada país é como uma família inteligente. Busca o que lhe falta e serve-se dos meios de persuasão para incutir comportamentos psicológicos colectivos. Sem me rever nos que defendem a reprodução massiva, mesmo quando incompatível com a produção de bens de subsistência e renda, sou pela família e pelo crescimento populacional moderado, cujo efectivo, quando adulto, atenda as necessidades produtivas do país e o equilíbrio das contas públicas que suportem o pagamento de uma pensão adequada aos reformados.

Para que tal aconteça, é preciso tomar-se uma decisão e unir esforços em direcção ao desiderato traçado. Os MDM devem seguir a linha mestra, mostrando o lado bom do caminho escolhido por quem nos governa. Vamos dar primazia aos filhos ou aos animais de estimação?

O Japão e outros Estados que registam taxas de fecundidade abaixo de 2 filhos por mulher já pedem mais nenês do que cães.
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Publicado pelo Jor. Angola de 17.03.24