- Ombelela nyê?!- Perguntava o tio Vinte e Cinco à mulher, sempre que chegasse da tonga¹.
- Lambiji kihi, Elombo?! - Indagava, igualmente, o meu pai, antes dos amicíssimos juntarem as jantas, uma noite em casa do tio Vinte e Cinco e outra em nossa. Era assim religiosamente.
Porém, o vizinho Cacebola, um ovimbundu que tinha estudado um pouco mais e que era capataz (ajudante do gerente), preferia pronunciar o termo conduto para se referir ao que acompanhava o pirão.
www.mozindico.blogspot.com faz referência a conduto (Angola) como "iguaria" acompanhante, sobretudo para o pirão/funji e outros alimentos.
Na meu consciente, o termo entra por volta de 1978, quando a minha família se mudou de Kitumbulu (fazenda de meu avô Fernando Ndambi) à fazenda Israel (comuna da Munenga).
Os trabalhadores ovimbundu da fazenda (rebaptizada Hoji-ya-Henda) usavam termos como pirão em vez de funji e conduto para a iguaria acompanhante.
Até então, o termo familiar, no "nosso Kimbundu de Kuteka", era lambiji².
Se calhar, por ser um povo ribeirinho (Longa), o peixe tenha sido o principal conduto de sua dieta, fora os vegetais que, senso geral, recebiam a designação de lambiji.
Genericamente, lambiji/ mbiji podia ser peixe, verduras, insectos (grilos, cigarras, térmitas/salalé, gafanhotos) ou carne.
- Lelo, lambiji kihi?³
- Lambiji xiwe!⁴
Ombelela era/é outra expressão usada pelos ovimbundu com quem privei na infância para se referirem à iguaria acompanhante do pirão.
O termo conduto vem ganhando força e "expansão nacional", impondo-se no léxico da Língua Veicular (Pt). Porém, é mister assinalar e registar as particularidades de cada região e povo, no que diz respeito às suas particularidades sociológicas e linguísticas, pois a construção do todo nacional passa, indubitavelmente, pelo "eu" de cada comunidade.
O angolano Carlos Figueiredo, professor e investigador de História e Linguística do Libolo, diz que "conduto é termo português, bastante usado no norte de Portugal, sendo que o seu uso em Angola terá a ver com as fases da colonização das diferentes áreas da então colónia, pois o termo era comum no Português da Idade Média. Note-se que a colonização de Benguela Nova (actual Benguela) e Planalto Central, ou seja das zonas Ovimbundu, dá-se a partir do início do séc. XVII, ou seja, quando ainda se falava o Português do período clássico. Esta ocupação é muito anterior à colonização do interior do Cuanza-Sul, que vai acontecer apenas no final do século XIX, quando já se fala o Português moderno. Portanto, no Libolo, a palavra “conduto” foi usada também para definir a a ração dada pelos colonos aos trabalhadores."
Fernanda Bandos, portuguesa, acrescenta que "conduto é um termo usado pelos meus avós portugueses, mas que tem sido substituído pelo termo acompanhamento em muitos restaurantes em Lisboa."
Por seu turno, o quissongoense (Libolo) Artur Cussendala recorda que, na sua aldeia, "todo o acompanhante é tratado genericamente por mbiji (peixe)".
O escritor e pesquisador social Gociante Patissa, quando solicitado a debitar sobre a expressão mbelela/ombelela, explica que "conforme as variantes do umbundu, mbelela ou ombelala podem referir-se exclusivamente ao conduto que tenha a ver com carne (de animal), passando o resto a integrar a categoria de "lombo", o que abarca também peixe e feijão. [É assim] na região de Benguela, os considerados vacisanji e vassale (estes últimos mais próximos do Kwanza-Sul)".
No leste/nordeste de Angola, onde predomina a língua Ucokwe, ikasa é o designativo do acompanhante de xima⁵. O poeta e jornalista João De Figueiredo Wassamba confirma que tal designação genérica "aplica-se a carne, peixe verduras, insectos e demais acompanhantes".
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¹- Empreitada. Parte distribuída, na fazenda, como empreitada diária.
² Acompanhante.
³ Hoje, qual será o acompanhante/conduto?
⁴ Será (carne de) paca.
⁵ O mesmo que funji para os ambundu. Os tucokwe comem, preferencialmente, pasta feita de farinha de mandioca (fuba de bombô).
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Publicado no Jornal Litoral de 9 de Março de 2023
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