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sexta-feira, outubro 23, 2020

A FALASTRONA E A CANECA DE CAFÉ

Ukãe wanditukãnla. Ati* "essa hora com caneca"?

Dez horas de domingo. O sol anunciava-se preguiçoso, apesar de o kasimbu ter ficado, oficialmente há 24 horas atrás. A vila, que também chamam de centralidade sem nada centrar, tirando o reencontro dormitorial de cada semana, tinha movimento lento e contável.
Uns regando jardins, outros varrendo os passeios e bermas e outros, sobretudo outras, entregues a conversas de quem tivesse trabalho em falta.
Man- Quarenta acordara cedo, como sempre, e estava dividido entre o balde de água para regar o jardim que plantou no passeio, a caneca de café que fazia o vai e vem (algumas vezes ficava na grade, para ser movimentada quer de dentro como de fora do muro de um metro) e a pá e vassoura para diminuir a areia na berma da estrada que, no seu dizer, "estragava o looking da moradia".
- Bom dia vizinho, bom dia vizinha, bom dia menino, bom dia menina ... - Era hábito dele cumprimentar enquanto homem do nascido no interior, cultivado a manter relações de boa vizinhança, mas sem a confiança de se pedir sal ou jindungu.
Depois de um "bom dia" um um condômino que se fazia desfilar em voz alta, foi agraciado caralmente com uma pérola.
- Kitangana kyeniki nyi neka bu mako?**
- Arra xisa! Essa pessoa vou lhe pôr na crónica. Pessoa não pega mais caneca é bêbado. E mesmo que fosse bêbado, domingo, dez horas, à espera de Kumbi Lixya-njila kanjimbi e companhia é pecado que Cristo não perdoaria? Está a me ofender pô-cá-di-quê?! - Bravou, mas só no coração.
Man-Quarenta, nascido numa aldeia organizada, embora rural, cedo mudou-se para um dos musseques de Luanda, onde ainda encontrou mulheres que varriam as ruas manhã cedo e ensinavam os filhos a observarem os bons costumes. Mesmo no "mato" onde nasceu, o espaço à volta de casa era limpo, o lixo enterrado ou queimado e a vizinhança era família. Se calhar foi isso que o pôs fulu.
- Porra, café na jatona é kapuka? - Rabujou autra vez em solilóquio, enquanto rebuscava uma boa música para descrever a pessoa faltadora de respeito.
Entre Bangão e o Trio Kusanguluka, veio-lhe "Vizinha yô vizinha, wabeta mon'ami. Ki ngamubwidisa mukonda, wangilomlolola ndaka. Vizinha yô kamaka!"
Continuou a rega e a varredura da berma da estrada que se tornara imunda pela acção da inicivilização humana e foi cantando sem pronunciar:
- Kutunga nê wijya... vizinha yô kamaka...***
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* A senhora ofendeu-me. Disse:
** Essa hora com caneca na mão? (Kimbundu)
*** ser vizinha deles é preciso ter cuidado. A vizinha é "makeira".


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