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quarta-feira, março 22, 2017

CONFUSOS E PROFUSOS

Dias inteiros sem energia eléctrica e duas tardes de chuva, em Luanda, foram bastantes para que o ambiente ficasse profuso e as ideias confusas. Entre chuva e estiagem, afina de contas, o que mais nos vale?

Estudei o ciclo da água na terra estudei-o na quinta classe dos anos oitenta do século passado, é mesmo cíclico: água nos rios, mares, lagos e lagoas; evaporação; acumulação de nuvens carregadas de partículas combinadas de hidrogênio e oxigênio; precipitação. E a roda continua a girar. Anos com maior e anos com intensidade. Em Luanda é igualmente assim. O ano de 2016 foi de intensa pluviosidade, trazendo o famigerado "caso Coelho" que este ano se vai, com certeza, aguentar, pois apenas agora a chuva nos visita com "alguma fúria”.

Mesmo sendo filho de camponeses, que por pouco nascia numa fazenda cafeícola familiar, vezes há em que defendo a estiagem para Luanda. Para quem vive os problemas infraestruturais da capital, bastaria chover intensamente no médio Kwanza e ai onde se faz agricultura de sequeiro. Luanda precisa é de água nos rios que a abastecem e de energia que "tudo move".

Apesar do esforço dos últimos tempos em se diminuir ou mitigar o impacto das quedas pluviais nos bairros da capital, são ainda incomensuráveis os efeitos perniciosos sempre que "São Pedro abre as comportas": estradas que deixam de cumprir a sua missão, viaturas e casas soterradas, quando não arrastadas pela corrente e deixando coros profusos de "ais"...
Passei por um grupo de homens e mulheres, à beira da Avenida Deolinda Rodrigues, que clamavam por mais chuva. Não que estivessem satisfeitos pela descarga do dia anterior e outra que se fazia anunciar. Era por que estavam sem como chegar ao local de prestação de trabalho e pior, descrentes em como conseguiriam voltar a casa, a tempo de apanhar os filhos nos centros de ensino.
Afinal de contas, entre chuva e estiagem, o que mais nos vale?
É obvio que essa escolha se torna impossível aos humanos. Só ao ciclo de água na terra e sua sazonalidade diz respeito. Mas continuo a pedir, sempre que falo com o altíssimo, que nos dê tantas bênçãos como chuva em Kangandala, porém menos chuva em Luanda.

Nota: Texto publicado pelo semanário Nova Gazeta a 29.03.2017. 

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