Sou dum tempo em que
óbito não era lugar para crianças e os jovens recolhiam-se, pesarosos, ao ver
um cortejo fúnebre passar. Os mortos mereciam muito respeito e as campas, por
serem últimas moradas dos de cujos, eram também respeitados.
Os tempos me parecem
ser outros. Os a vida evoluiu e eu fiquei estagnado no tempo ou as coisas
desandaram e eu cultivo modos que muita juventude desconhece.
Desloquei-me ao Alto
das Cruzes, para “partilhar a dor” de
alguém que perdeu uma ente querida. Entre vândalos que pisam campas “alheias”, num
desrespeito total aos finados e aos familiares, muitos aí presentes, uma idosa cuja
atitude diária chamou-me à atenção.
Pipa, o filho dela, foi morto (assim reza a lápide) em
Fevereiro de 1976, aos 17 anos. Pela foto, o jovem era militar. A sua campa
diferencia-se das outras por ter o terreno adjacente pintado de cinza
metalizada e a óleo. Há vasos com flores naturais e folhas verdes bem
cuidadas. Não se vê poeira em canto nenhum daquele túmulo que se parece a uma
casa. A idosa, desde Fevereiro de 1976 que faz companhia ao jovem soldado todos
os dias, pelo menos trinta minutos. Já não chora. Chega, vassoura, balde d´água e pano de pó na mão: rega as plantas, limpa o pó, recolhe as folhas
secas, senta num banquinho, olha para a campa, projecta um reencontro, que
espera para breve, e faz uma oração.
E, comovido, chorei.
1 comentário:
Essa pouca vergonha fez-me escrever mo texto "os funerais de hoje em dia" no meu blog.
Por muito que me dos, prefiro nem estar presentes nos funerais porque me da nojo.
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