NOTA: O texto que se segue é da autoria de Graça Campos, exímio artista das letras. Por o ter considerado monumental e "
Indecências
Sinto profunda nostalgia de alguns aspectos da "ditadura do proletariado" que nos governou até aos 90. Daqueles tempos, guardo algumas boas lembranças da disciplina, da solidariedade, da decência e outros.
Naqueles tempos, ninguém ficava indiferente a um óbito em casa do vizinho; ninguém assobiava para o lado à passagem de um cortejo fúnebre. E, claro, mulher alguma ia ao funeral para mostrar as pernas ou as mamas.
Naqueles tempos, a ODP reprimia, adequadamente, as afrontas à moral pública. Cidadãos surpreendidos em actos merecedores de algum recato, como sejam namorar ou, mesmo, ir um pouco mais além, eram apropriadamente açoitadas com catanas. Fossem eles quem fossem. Aliás, naquela altura, todos éramos, apenas, angolanos. Ser filhinho de papai é invenção dos dias hoje. Naqueles tempos, o que orgulhava as famílias era ter um membro nas FAPLA. Hoje, como se sabe, os motivos de orgulho são outros: cifrões e sobrenomes.
As pessoas que estão abaixo da minha geração acreditam que corrupção em Angola é chaga que vem do passado. Não é nada. No "meu tempo" corrupção ...só nos livros.
Quando olham para as fortunas de algumas famílias, as gerações mais novas podem ser induzidas a pensar que esse processo de acumulação vem do passado. Nada mais falso! Há 20 e poucos anos, todos, ou quase todos, estávamos no mesmo patamar. Sem fortunas, mais felizes da vida.
Naqueles tempos todos éramos todos os tais " ana mbuiji tu dila xinji dimixi", cantados pelo inesquecível David Zé.
Mas do que tenho mesmo muita saudade do passado é da decência. Naqueles belos tempos era de todo inconcebível que um cidadão angolano se apresentasse aos balcões da TAAG para fazer check in de calções e camisola sem manga, os chamados parte os cornos. Aliás, pessoas assim vestidas seriam travadas a vários metros da entrada do aeroporto.
Hoje, faz-me imensa confusão que a um matulão de 20 ou mais anos seja permitido viajar nos aviões da TAAG de tangas e parte os cornos. Onde é que já se viu isso? Por causa desses liberalismos, até mesmo os vôos internacionais da TAAG estão transformados em quitandas de mau cheiro porque se permite que matulões viagem de camisolas sem manga, expondo os seus sovacos a outros passageiros. Ua, meu Deus, quanto dibuzo sai daqueles sovacos...
Por tudo isso quero deixar aqui uma sugestão: que a TAAG, a Alfândega, SME e outras autoridades que operam nos nossos aeroportos internacionais travem a indecência. Calções são para crianças. Adulto que se apresente num aeroporto para uma viagem indecentemente vestido deve receber ordem para fazer QRF imediato.
Aliás, como podem mãe, esposa ou namorada que se prezem permitir que o seu ente saia de casa de "cuecas" e bibe para uma viagem?
Eu não acredito que o mundo ache graça alguma ao facto de alguns angolanos preferirem viajar mal vestidos. Pelo contrário.
Se dependesse exclusivamente de mim autorizaria a TAAG o exercício do direito de preferência.
Todas as discotecas de Luanda vedam o acesso a pessoas inapropriadamente vestidas. A TAAG, um dos principais símbolos do país, deveria, no mínimo, ser autorizada a adotar procedimento similar.
Em homens adultos, calções, chinelos e parte os cornos são trajes de quintal e praia e nunca para viajar em avião público.