De três proposições haverá pelo menos uma válida. Era comum, nas minhas andanças pela rota entre Kaxitu [carne pequena] e o Wizi, encontrar "carne pequena" exposta à beira da estrada: símios, seixas, veados, pacas e outros bichos do mato, caçados com armadilhas ou caçadeiras, pendurados em varas ou estendidos sobre folhas de bananeira. A paisagem era quase sempre a mesma — aldeões atentos ao movimento, compradores de passagem, e o cheiro da caça fresca a anunciar o sustento do dia.
Recentemente, fiz uma viagem de ida e volta a Maquela do Zombo, passando por Mpangi a Lukeni [Pango a Luquém], e algo me surpreendeu: não vimos animais expostos, nem carne já tratada. O silêncio da estrada parecia dizer mais do que mil cartazes. Terão desaparecido os animais nas redondezas, vítimas da caça desenfreada? Terão os aldeões despertado para o risco da extinção? Ou será que a fiscalização apertou o cerco aos caçadores furtivos?
Seja qual for a resposta — ou se forem todas juntas —, o certo é que, enquanto as papilas gustativas reclamavam a ausência de carne de caça, a consciência ambiental regressava tranquila. Porque, se a caça para fins alimentares é compreensível e até legítima em muitos contextos rurais, a caça mercantilista, feita sem critério nem medida, é eticamente reprovável e ecologicamente perigosa.
Em Angola, a caça de subsistência está profundamente enraizada nas práticas ancestrais dos povos do mato. É fonte de proteína, rito de passagem, saber transmitido entre gerações. Eu próprio iniciei-me na arte da caça com tenra idade, no actual município da Munenga: primeiro como acompanhante dos mais velhos, depois como carregador de presas abatidas, e mais tarde como caçador singular, com armadilhas feitas à mão e olhos treinados para ler pegadas.
Mas os tempos mudam. Segundo o Decreto Presidencial n.º 222/24, que regula a caça e a gestão sustentável da fauna selvagem em Angola, é imperativo garantir o equilíbrio ecológico, a justiça social e a preservação das espécies. A Estratégia Nacional da Biodiversidade (2019–2025) reforça que a exploração dos recursos biológicos deve atender às necessidades actuais sem comprometer as gerações futuras.
O ponto de equilíbrio talvez esteja aí: entre o respeito pela tradição e a responsabilidade com o futuro. Caçar para comer, sim. Caçar para enriquecer, não. Preservar o que resta, regenerar o que se perdeu, e educar para que a caça continue a ser um saber — e não uma sentença de morte para a biodiversidade.
Porque, no fim, a estrada do Wizi não é apenas um caminho asfaltado ao qual confluem outros caminhos nascidos no denso sertão. É também um espelho do que somos e do que escolhemos deixar para os que vêm depois.

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