Eventualmente, fosse chamado kunanga ou biscateiro.
Certa vez, apresentando-me a uma jovem aparentemente esbelta mas cujo cérebro, cheguei a avaliar, era de gafanhoto, que me perguntou "o que é que eu era" e tendo-lhe respondido 'professor", a "cientista da petulância" teve mesmo a coragem de perguntar:
- Só és professor e não fazes mais nada?!
Tal é a forma mesquinha como os professores são muitas vezes encarados pelos entes sociais. Vamos ao...
- Só és professor e não fazes mais nada?!
Tal é a forma mesquinha como os professores são muitas vezes encarados pelos entes sociais. Vamos ao...
s poucos.
Quando era jornalista no activo e ministrava aulas à tarde, a pergunta que as pessoas me colocavam quando se apercebessem das minhas ocupações profissionais era:
- Ah, tu és jornalista e dás aulas à tarde, nê?!
Vejamos: ser jornalista, eventualmente, por ser profissão liberal "equivale", no conceito de alguns, a um "não trabalho", pois para essas mesmas pessoas o trabalho significa passar todo o dia no local da prestação de serviço como o "fazem" os funcionários públicos ou colaboradores de empresas transformadoras/fornecedoras de produtos e de serviços.
Para os tais, ser, por exemplo, estivador no porto, pedreiro algures, desentupidor de fossas (também socialmente úteis) é o que equivale a ser trabalho/trabalhador, sendo o uso da força o maior qualificador profissional.
Em conversa com dois meus antigos mestres, foram unânimes num pequeno detalhe. Diziam eles que "ser professor já foi tido como trabalho de muito respeito e consideração social. Agora, desde que os fugitivos à tropa e outros sem habilidades para coisas mais sérias inundaram a nobre profissão de formar e transformar a nova geração, ela, a profissão, se tornou aos olhos de muitos como uma 'simples ocupação', um biscate ou 'refúgio dos que têm tempo de sobra"', fim de citação.
Já tive um período de aproximadamente cinco anos em que o regime de trabalho, a inexistência de escolas particulares de nível médio e/ou superior com aulas nocturnas e a distância entre o local em que trabalhava/habitava e a cidade mais próxima (Saurimo) me inibiram de "dar aulas". Nessa situação, eu era para as pessoas que retrato um trabalhador. No entender deles, entregava-me cabalmente ao patrão, à semelhança do que dizem fazer os funcionários públicos, bancários e outros.
- O fulano trabalha no banco xis. O beltrano trabalha no Porto do Dande. A sicrana trabalha no Maria Pia (hospital). O André dá aulas.
- A Andreia o quê que faz?
- É jornalista!
Vejamos o que me dizem/perguntam, agora que sou funcionário público e professor.
- Ai é? Trabalhas o dia todo e dás aulas à noite?
Veja bem. No entender deles, enquanto funcionário do Estado (administração pública), trabalho. Já como professor, mesmo que fosse em escola pública, não trabalho. Apenas dou aulas!
Nem juntando ao ofício da educação o de jornalista sou trabalhador...
E se fosse simplesmente professor, ministrando aulas à noite, o que diriam de mim?
Publicado pelo Jornal de Angola de 12.05.19
Quando era jornalista no activo e ministrava aulas à tarde, a pergunta que as pessoas me colocavam quando se apercebessem das minhas ocupações profissionais era:
- Ah, tu és jornalista e dás aulas à tarde, nê?!
Vejamos: ser jornalista, eventualmente, por ser profissão liberal "equivale", no conceito de alguns, a um "não trabalho", pois para essas mesmas pessoas o trabalho significa passar todo o dia no local da prestação de serviço como o "fazem" os funcionários públicos ou colaboradores de empresas transformadoras/fornecedoras de produtos e de serviços.
Para os tais, ser, por exemplo, estivador no porto, pedreiro algures, desentupidor de fossas (também socialmente úteis) é o que equivale a ser trabalho/trabalhador, sendo o uso da força o maior qualificador profissional.
Em conversa com dois meus antigos mestres, foram unânimes num pequeno detalhe. Diziam eles que "ser professor já foi tido como trabalho de muito respeito e consideração social. Agora, desde que os fugitivos à tropa e outros sem habilidades para coisas mais sérias inundaram a nobre profissão de formar e transformar a nova geração, ela, a profissão, se tornou aos olhos de muitos como uma 'simples ocupação', um biscate ou 'refúgio dos que têm tempo de sobra"', fim de citação.
Já tive um período de aproximadamente cinco anos em que o regime de trabalho, a inexistência de escolas particulares de nível médio e/ou superior com aulas nocturnas e a distância entre o local em que trabalhava/habitava e a cidade mais próxima (Saurimo) me inibiram de "dar aulas". Nessa situação, eu era para as pessoas que retrato um trabalhador. No entender deles, entregava-me cabalmente ao patrão, à semelhança do que dizem fazer os funcionários públicos, bancários e outros.
- O fulano trabalha no banco xis. O beltrano trabalha no Porto do Dande. A sicrana trabalha no Maria Pia (hospital). O André dá aulas.
- A Andreia o quê que faz?
- É jornalista!
Vejamos o que me dizem/perguntam, agora que sou funcionário público e professor.
- Ai é? Trabalhas o dia todo e dás aulas à noite?
Veja bem. No entender deles, enquanto funcionário do Estado (administração pública), trabalho. Já como professor, mesmo que fosse em escola pública, não trabalho. Apenas dou aulas!
Nem juntando ao ofício da educação o de jornalista sou trabalhador...
E se fosse simplesmente professor, ministrando aulas à noite, o que diriam de mim?
Publicado pelo Jornal de Angola de 12.05.19