A carga pedagógica nos provérbios em Ngoya
A zona sobre qual me vou debruçar é a que vai do Libolo a Kibala, abrangendo Kilenda, Ebo, Gabela, Mussende e parte do Uaco Kungo. (Exibir mapa).
Trata-se de uma zona de transição etnolinguística entre os ovimbundu e os ambundu. Por isso, a nossa língua contém elementos das duas línguas com maior ou menor acentuação, à medida que nos vamos aproximando ou distanciando dos pólos.
Trata-se de uma zona de transição etnolinguística entre os ovimbundu e os ambundu. Por isso, a nossa língua contém elementos das duas línguas com maior ou menor acentuação, à medida que nos vamos aproximando ou distanciando dos pólos.
No período da existência do reino do Ndongo, o Libolo, a Kibala, Ebo, Kilenda Gabela e até parte do Uaco Kungo eram partes integrantes deste reino, razão pela qual quando perguntamos a alguém que língua fala, a resposta é sempre Kimbundu. Demonstrou-o muito bem o Reverendo Vinte e Cinco no seu livro “Os Kibalas”. O Dr. Moisés Malumbu no seu livro “os ovimbundos do planalto central de Angola” faz também excelentes apreciações sobre os povos vizinhos dos ovimbundu e das relações de interdependência.
Não basta, porém, esta relação de pertença para dizermos, como muitos o fazem, que “somos bailundus ou kimbundus por extensão da língua. Temos características próprias, costumes próprios e uma língua própria que deve ser estudada. Temos os nossos provérbios com grande carga pedagógica e no que toca a outras particularidades da nossa cultura e História, é só vermos que nenhum outro povo, dos que habitam Angola, construiu necrópoles (sepulturas em pedras) senão os nossos ancestrais.
O que quero partilhar convosco é que independentemente dos kibalas falarem uma língua parecida com o kimbundu ou umbundu, esta língua tem um nome. Deve ser perpetuada a novas gerações e por isso, investigada, divulgada e ensinada.
Tenhamos como exemplo a própria língua portuguesa que falamos, herdada do colono.
É uma língua que deriva do latim, tal como o espanhol, o italiano, o francês, o romeno, entre outras e recebe empréstimos do inglês e línguas africanas.
-O português é ou não uma língua própria?-Tem ou não um nome?-É ou não estudado, desenvolvido, divulgado e transmitido a novos falantes?
Este exemplo chama-nos atenção para o que devemos fazer para a valorização da nossa língua.
Não quero, aqui e hoje, definir que nome atribuir à nossa língua. Pesquisei um pouco e encontrei várias divergências entre os autores. Mas que temos que investigar, isso temos.
Em seguida quero mostrar-vos o que tenho feito para demonstrar a carga pedagógica dos provérbios da nossa língua que chamo por ngoya neste ensaio.
Em seguida quero mostrar-vos o que tenho feito para demonstrar a carga pedagógica dos provérbios da nossa língua que chamo por ngoya neste ensaio.
(Posso pecar na pronúncia e na grafia, pois não temos um alfabeto adoptado, mas o sentido está lá. O resto vai melhorar com as vossas contribuições).
Sentido pedagógico dos provérbios
Permitam-me que vos fale um pouco da Grécia antiga, tida como “a terra do ‘franco falar” pela liberdade existente na altura dos grandes filósofos como Sócrates cuja escola forjou o grande Platão (Atenas) e a Academia, Aristipo (Cirene) e os cirenaicos, Diógenes e os cínicos, Euclides (Megara) e os megáricos, entre outros.
Hoje, mais de 25 séculos passados, O "grande mestre" tem sido ainda opção preferida de muitos educadores que lembram o hábil inquiridor, que finge tudo ignorar para tudo demolir, e investir, a seguir, despido dos julgamentos precipitados, na construção do saber, legitimado pela participação do interlocutor. É a refutação e a maiêutica. Assim é também a escola ngoia nos seus fundamentos didácticos.
Vejamos os casos seguintes:
1. -O mahaki o’hombo a zekessa ombua o nzala.
1. -O mahaki o’hombo a zekessa ombua o nzala.
Literalmente para o português significa que por confiar demasiadamente na queda dos testículos do cabrito que serviriam para o seu jantar o cão passou fome.
Perante uma acção precipitada, os mais velhos largam sempre este conselho. Depois de uma introspecção, o jovem deve concluir que: é preciso ter sempre um plano alternativo e não confiar demasiadamente numa única via.
O provérbio análogo e mais adaptado para aconselhar crianças é o que dita:
-Úlielela kufula, kuimba ndungue úputu. (confiar é falhar, aconselhar é carência de actividade). Este, tem o mesmo significado real e mesma carga pedagógica que o precedente.
Mas há outros exemplos:2.
Mas há outros exemplos:2.
_Hima oli tombetá kundenji inji uenjia’co.Numa tradução literal para a língua portuguesa significa que: por mais que o macaco faça piruetas, conhece sempre o precipício.
Sentido pedagógico: Por mais que alguém seja louco está sempre ciente do perigo.
Em educação, as teorias vão e vêm, as experiências se sucedem, mas, por vezes, algumas ideias permanecem e algumas experiências resistem, ainda que de forma parcial, a novas práticas.
Vejamos agora:
_Uateleka sanji li uilo ué.
Literalmente para português quer dizer que: quem cozinha uma galinha também tem vontade de comer carne.
Sentido pedagógico: Um convite para se estar à vontade não deve significar libertinagem.
Em que contexto se aplica?
Lá na Kibala quando se abate uma galinha para uma visita ela deve ser servida completa. Os anfitriões comem o que restar da mesa. O convidado deve porém saber que pelo facto de lhe ter sido servido o frango completo não significa que os anfitriões não gostem de carne de galinha.
Os provérbios em ngoia reflectem também um ensino virado para a experiência.
_Quantos apressados terão sido arrastados pela corrente de um rio sazonal por imprudência?
Aqui a nossa sabedoria dita através de mais um provérbio:
-O luiji ki luezuka lupixile.
(se o rio estiver cheio deixe-o passar).
O ensinamento é que: se alguém estiver furioso deixe-o descarregar toda a sua fúria e aborde-o depois para chamá-lo à razão. Pelo contrário não haverá entendimento. Ou ainda, se se deparar com um conflito deixe primeiro amainar os ânimos. Não seja apressado.
Por: Soberano Canhanga
Bibliografia
-Baptista Mondin: Introdução a Filosofia
-Gabriel Vinte e Cinco: Os kibalas
-Gilda Naécia de Barros: Sócrates -Raízes Gnosiológicas do Problema do Ensino- Conferência na Fac. Educação da Universidade de São Paulo.
-Moisés Malumbu: Os ovimbundos do planalto central de Angola.
2 comentários:
Soberano, gostei muito desta lição. As línguas nacionais angolanas e todo o saber que nelas está contido merecem o mais completo apoio e divulgação.
No que diz respeito à língua ngoia (não seria preferível escrever ngoya?), posso deduzir que o idioma vai variando uniformemente desde o kimbundu puro até ao umbundu puro, sem que se verifiquem "saltos" na sua gramática e no seu vocabulário, à medida que nos vamos deslocando de norte para sul? A mim, parece-me pouco provável.
Obrigado, Denudado, pela sugestão.
Abri um espaço, exactamente, para as contribuições.
Mais uma vez, o meu muito obrigado.
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