À frente do hotel em que estava hospedado, a kamunda mostrava-se arejada e asseada. Árvores poucas, relva escassa mas cuidada, porquice nada!
Mangodinho recuou a fita e ficou a pensar na Ilha Seca do seu Zango III e ainda na na sua Boavista do Sambila.
- Epá, esse mambo, se fosse na banda, era "bom sítio" para casitas de lata e aguardar pelo realojamento do Estado. Mas aqui nada. - Pensou.
Passeou o olhar à volta e viu a montanha grande, parecida com mesa, lá em cima, também toda sem brilho e sem lixo a transbordar como acontece na sua Table Moutain da Coreia, na Samba, cujo topo abre caminho ocular para a ilha do Cabo, Xikala, Musulu e ilha da Kazanga.
- Será que é por causa da ausência de casotas oportunistas de chapa? É que isso não brilha mesmo!
Na tasca mais próxima, foi tomar uma bebida que se parecia ao "usa bem", kapuka da ponteira, feita de usambe (batata-doce em Umbundu). Precisava de diminuir o cansaço da marcha e puxar o calor que não vinha, mesmo andando debaixo de sol intenso. Melhor, Mangodinho precisava era de "caloriar", como ele apelida o suor.
De espanto em espanto, viu ainda que na rua nenhuma dama andava com lata de gasosa na mão para cuspir.
- Nem só uma? Mas aqui as damas não cospem nem no chão nem na lata de gasosa?
Sorveu as últimas gotas do "usa bem" e limpou a boca.
- Quantué?
- What?
- Quantué?
- I dont undertand you.
Lembrou-se que tinha falado português.
- How much?
- Nine, five.
Pegou na cédula de cem Rands e a estendeu à balconista. Esta, por sua vez, tardava em devolver o troco pensando ser "tip". Já lá iam trinta minutos.
Mangodinho ficou a banzelar.
- Essa mboa não me traz o kumbu do troco, porquê? Xê, se pensas que vais me aguentar estás mal enganada. Vou te mostrar que antes dessa vida Mangodinho, que sou, eu já era vivo.
Aproximou-se à moça e puxou coragem. Pensou em Português, traduziu ao pé-da-letra, soletrou as sílabas anglófonas e disparou:
- Misse, for other things, I can not speaking your language, but for money I can. Please, give me my change.
A moça, aprendiz de aguentadora, que já haviam feito suas contas para o after work, pôs mudança de recuo e entregou-lhe o kumbu.
- Fogo! Nessa vida é preciso ser viju. - Comemorou, pedindo mais um shot que apelidou de "usa bem" à moda angolana.
Publicado pelo Jornal de Angola, pag. 10, edição de 26.02.2018