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sexta-feira, junho 22, 2018

NADAR E VOAR


Dois conhecidos, já na terceira idade, homem e mulher, cruzaram na Ilha de Luanda, num "amistoso" daqueles que se organizam para se sair da mesmice do bairro. O homem foi com seus amigos e ela estava a procura de emprego. Ainda nem tinham acabado de matar a saudade, nem ela tinha explicado ao curioso do André o que a levara al´, de concreto. A saliva e os suores dos beijos estampados em rostos húmidos ainda nem haviam secado. De repente, ouviu-se um grito saído de não muito longe, à beira-mar .
- Ai Wé, socorro, wé! Moça stá se afogá. Alguém que acode só?
A mana Belita olha para o compadre dele e diz.
- Compadre vai lá salvar a moça. Imagina é tua filha a precisar de socorro. O mano mesmo que nasceu aqui na ilha fica mbora assim zututu, não vai lá ajudar? Tira a camisa e as calças e nada.
André olhou para Belita e, não querendo enfrentar a desaprovação colectiva emitiu um muito baixo murmúrio:
- Belita, não sei nadar.
- O quê, compadre André? Isso é gozo ou quê? Você que nasceu e mora na ilha não sabe nadar? Anda a fazer então quê só nesse mundo?
André, sorvia o seu terceiro trago de usabem (walende das ponteiras feito de usambe). Empurrou com pressa o que restava na caneca, e como que toma a decisão de fazer o que dele se solicitava, ergueu o peito, amaciou com saliva os lábios, olhou para Belita e retorquiu.
- Comadre Belita me diz ainda. Tu que nasceste e vives ao lado do aeroporto, por ventura, sabes voar? Me diz ainda!

Publicado pelo jornal Nova Gazeta a 22/03/18

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